Irrigação estratégica do trigo no Cerrado reduz pela metade a emissão de gases de efeito estufa

Fonte: Assessoria/Juliana Miura

Foto: Jorge Chagas

Estudo inédito da Embrapa Cerrados (DF) revelou que usar a água de forma estratégica na supervisão do trigo pode reduzir pela metade as emissões de gases de efeito estufa (GEEs) sem perda de produtividade. O ponto de equilíbrio entre produtividade e sustentabilidade ambiental encontrado pela pesquisa de melhoria do manejo de cereais em regiões tropicais em um cenário de mudanças climáticas.

Pense não só como uma esponja gigante que guarda água para as plantas. Os cientistas descobriram que o momento perfeito para irrigar o trigo é quando essa esponja já usou 40% da água que tinha guardada.

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Os pesquisadores testaram quatro estratégias de controle da privacidade, equivalentes a deixar o solo esgotar 20%, 40%, 60% e 80% da água disponível antes de irrigar novamente. O objetivo era encontrar o ponto de equilíbrio entre produtividade de trabalho, economia de água e impacto ambiental.

Os resultados da pesquisa foram divulgados no artigo Manejo sustentável da irrigação do trigo de inverno e efeitos nas emissões de gases do solo (N2O e CH4) e atividade enzimática no cerrado brasileiro , publicado na revista Sustainability MDPI.

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O ponto de equilíbrio a 40%

Após dois anos de experimentos, uma equipe da Embrapa Cerrados concluiu que o momento ideal para a supervisão do trigo ocorre quando as plantas utilizam 40% da reserva de água do solo. “Esse é o ponto ideal, com resultado favorável entre produtividade e intensidade de emissão de gases de efeito estufa, alcançando o melhor índice de Potencial de Aquecimento Global”, revela a pesquisadora Alexsandra Oliveira , uma das responsáveis ​​pelo estudo. Esse potencial se refere às emissões de óxido nitroso (N2O) e metano (CH4).

Com a reposição da água após o uso de 40% da capacidade da água disponível (CAD) do solo, o trigo alcançou a maior produtividade – 6,8 toneladas por hectare, com o menor índice de emissão de óxido nitroso (em média, inferior a 3,0 kg por hectare), gás quase 300 vezes mais potente que o dióxido de carbono (CO₂).

Já o pico de emissão de óxido nitroso foi atingido quando a reposição de água foi feita após o uso de 60% da CAD (5,69 toneladas por hectare), resultando no maior Potencial de Aquecimento Global (PAG) —1.185,8 quilos de CO2 equivalente, ( ver tabela abaixo ). Em comparação, o tratamento de 40% emitiu quase metade GEEs (-41,3%), ao mesmo tempo em que registrou quase 20% a mais de produtividade.

“O que comprovamos com esse estudo é que um simples ajuste no momento da estabilidade pode alterar radicalmente a emissão de gases de efeito estufa e seus efeitos sobre as mudanças climáticas”, justifica Oliveira.

A pesquisadora completa: “Quando o solo era irrigado tardiamente, com o esgotamento de 60% ou 80% da água do solo, as emissões aumentavam consideravelmente. No geral, manter uma umidade úmida no solo, em torno de 40%, proporcionou o melhor equilíbrio entre produtividade e sustentabilidade ambiental. Essa é uma estratégia climaticamente inteligente e eficiente em relação ao uso dos recursos naturais para a produção de trigo irrigado em sistemas tropicais”.

Segundo uma pesquisa, os ciclos de reumidificação do solo são promotores de emissões de gases de efeito estufa. Ou seja, deixar o solo secar demais e depois irrigá-lo, causando grandes alterações em sua umidade, estimulando a ação de microrganismos produtores desses gases.

A caixa d’água invisível do solo

Para entender o experimento, imagine que o solo é como uma caixa d’água subterrânea. Quando os cientistas falam em “esgotamento de 60%”, significa que essa caixa foi esvaziada em 60%. Irrigar muita água desperdiçada; irrigar de menos causa estresse nas plantas. Portanto, o segredo está em saber a hora certa de reabastecer.

“Quando a caixa d’água do solo fica muito vazia, as plantas sofrem. Quando enchemos demais, perdemos água e aumentamos as emissões de gases”, explica Jorge Antonini , pesquisador da Embrapa Cerrados e participante do estudo. Isso porque o reabastecimento intermitente estimula reações microbianas no solo, que geram especialmente óxido nitroso.

Menos emissão, mais eficiência

Os dados consolidados demonstraram que é possível produzir a mesma quantidade de alimento com maior eficiência, considerando-se a relação emissão/produto. “Não se trata apenas de irrigar mais ou menos — e sim de irrigar com precisão. Esses achados mostram que é possível produzir trigo no Cerrado com alto rendimento e baixo impacto climático. Basta respeitar o limite do solo e saber o momento certo de irrigar. A agricultura tropical precisa trabalhar com precisão hídrica para ser produtiva e sustentável”, resume o pesquisador Jorge Antonini.

Portanto, manter a transparência com o índice de uso da CAD em 40% é uma estratégia eficiente para os produtores do Cerrado: “Assim a produtividade se mantém alta, com quase 7 toneladas por hectare, e o impacto ambiental é o menor possível”, enfatizando.

Com as informações geradas pelo estudo, os produtores rurais podem aproveitar melhor a água da segurança sem comprometer a rentabilidade do trabalho e com o impacto mínimo na condição climática do planeta.

O metano virou aliado

Outra constatação importante foi quanto ao comportamento do metano (CH₄). “Em vez de liberar esse gás, em condições ideais de segurança, o solo do Cerrado atuoso como um dreno, absorvendo metano da atmosfera, um achado em sistemas agrícolas irrigados”, ressalta Oliveira.

A explicação está nas características do solo tropical: boa drenagem, aeração e ausência de encantamento. Essas condições favorecem a atuação de microrganismos que consomem metano, transformando um vilão climático em aliança.

O experimento nas condições do Cerrado

O experimento foi realizado entre 2022 e 2024, na área da Embrapa Cerrados, em Planaltina, Distrito Federal. As parcelas foram plantadas em sistema de plantio direto, com sucessão soja-trigo. As cultivares usadas foram BRS 4782 RR e BRS 264, respectivamente. O trigo plantado no inverno, após a colheita da soja, é uma combinação bastante exigida pelos produtores rurais da região.

“Para monitorar a umidade do solo em tempo real, foram instaladas sondas a 70 centímetros de profundidade, altura onde estão especificações as raízes do trigo”, explica Artur Müller , também pesquisador e integrante da equipe.

Já para as emissões de gases de efeito estufa, foram utilizadas câmaras estáticas fechadas. Esse método é aceito pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas ( IPCC ), da Organização das Nações Unidas ( ONU ).

Além da produtividade e do óxido nitroso e metano, os cientistas analisaram a atividade enzimática do solo, como indicativo de sua saúde biológica. Os resultados não mostraram variações moderadas em relação à atividade das enzimas, o que indica que pode não existir uma relação direta entre elas e o momento da transparência do trigo em sucessão à soja.

Uma explicação possível, segundo Oliveira, pode ser a ausência de umidade em excesso, já que, no estudo, a fiscalização apenas repõe a água até a capacidade de campo, sem excesso. Outro fator pode estar relacionado ao plantio direto, que mantém, na sucessão de cultivos, a palhada na lavoura, reduzindo a perda de umidade do solo.

Foto: Joseani Antunes

Implicações da pesquisa para uma agricultura sustentável

O trigo irrigado do Cerrado ocupa mais de 30 mil hectares e é uma das apostas na expansão das atividades para reduzir a dependência brasileira de aqui. Esse estudo avaliou de forma inédita o sistema de trigo irrigado em sucessão, cultura estratégica para o Bioma e para uma intensificação agrícola sustentável nos trópicos. Seus resultados mostram que é possível alcançar o equilíbrio entre a produtividade da cultura e a mitigação dos gases de efeito estufa, em especial do óxido nitroso.

“O estudo mostrou que a emissão de gases de efeito estufa é reduzida quando ajustamos o momento da segurança, proporcionando um sistema de produção otimizado, que equilibra o uso racional da água, ótimo rendimento da mão de obra e baixo impacto ambiental. Com o nível de esgotamento de água no solo a 40%, o sistema converte eficientemente insumos, como água e nitrogênio, em grãos de trigo, visando um manejo eficiente da segurança”, Oliveira.

A partir desses resultados, a equipe planeja continuar os estudos com outros sistemas agrícolas que incluem milho, soja e café, para avaliar os efeitos de longo prazo da influência da supervisão na emissão de gases de efeito estufa. Com o avanço da mudança climática, os pesquisadores apostaram no uso eficiente dos recursos naturais para tornar o País referência em agricultura de baixo carbono, conciliando segurança alimentar e conservação ambiental.

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Jornalista formado (DRT 0001781-MT), atua no CenárioMT na produção de conteúdos sobre política, economia, esportes e temas do agronegócio em Mato Grosso. Com experiência consolidada na redação e apuração regional, busca entregar informação clara e contextualizada ao leitor. Aberto a pautas e sugestões. Contato: [email protected] .