No último sábado a usina hidrelétrica de Sinop, no rio Teles Pires, deveria começar a fornecer energia. Porém não foi que aconteceu. Após cinco de obras e investimento de R$ 2,9 bilhões a usina esta praticamente pronta, 99,8% de execução física. O problema é que a Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema) ainda não deu a licença ambiental para o enchimento da represa, que acumulará a água para mover as duas turbinas, com 402 megawatts de capacidade instalada. A licença ambiental de operação, pré-requisito para o enchimento da represa, foi pedida à Sema em 18 de janeiro. Até hoje não houve resposta.
A área do futuro reservatório foi desmatada, como mandam as boas práticas ambientais, e só falta enchê-lo para atender à demanda por energia de 1,6 milhão de consumidores.
O plano da concessionária Sinop Energia, controlada pela francesa EDF (Electricité de France), era começar a inundação de uma área de 330 quilômetros quadrados em setembro. Isso permitiria aproveitar a abertura da temporada de chuvas e os meses em que o rio Teles Pires fica mais caudaloso.
Para cumprir com suas obrigações contratuais de suprimento para 34 distribuidoras, a concessionária precisa ir ao mercado “spot” e repor todo esse montante, pagando mais caro pela energia que não está conseguindo entregar.
Se a licença de operação não sair até janeiro, a vazão do rio começa a ficar tão baixa que será preciso aguardar a próxima estação chuvosa para o enchimento do lago. A “janela hidrológica” estaria definitivamente perdida e o atraso na geração de energia chegaria a um ano.
Para o diretor da multinacional francesa EDF no Brasil, Yann des Longchamps, esse tipo de situação cria um ambiente de desconfiança entre investidores no setor. “Gera insegurança muito grande e desestimula novos investimentos, pelo menos em hidrelétricas”, afirmou o executivo para o jornal Valor Econômico .
O Ministério Público Federal (MPF) entrou na Justiça com uma ação civil pública em que pede para suspender a licença de instalação do empreendimento. Um dos pontos contestados pelos procuradores é o valor das indenizações às famílias que terão suas propriedades inundadas. O MPF sustenta que laudos do Incra estipularam um valor do hectare até 300% maior do que o realmente pago.
Enquanto isso, promotores do Ministério Público Estadual (MPE) instauraram inquérito para apurar supostos danos ambientais causados pelas obras da usina e contestaram o montante definido como compensação.
Longchamps acredita que essas iniciativas do MPF e do MPE causam desconforto, medo até, nos agentes públicos responsáveis pelo licenciamento. Como eles ficam expostos a processos judiciais mais adiante, segundo raciocina o executivo francês, tendem a assumir uma postura excessivamente cautelosa ao fazer suas análises e assinar documentos.
Para os promotores, a empresa deveria ter cortado 100% da vegetação na área do reservatório. Já o empreendedor argumenta que a supressão de 30% das árvores na represa, além de atender às condicionantes do licenciamento, têm fundamentação técnica. Tirar mais do que isso, alega a Sinop Energia, comprometeria a oxigenação do futuro lago e dificultaria a sobrevivência dos peixes.
A Sema, responsável pelo licenciamento ambiental, disse que busca conciliar a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável do Estado em seus trabalhos. “A finalização do processo para emissão da licença de operação será feita mediante critérios utilizados até aqui, ou seja: estritamente técnicos e científicos, por meio de pareceres e análises elaborados pelos analistas de meio ambiente da pasta”, informou a Sema, por sua assessoria.
Ainda de acordo com a secretaria, não está correto supor que o aval ao enchimento do lago deveria ter saído seis meses após o pedido feito pela concessionária, em janeiro. “O prazo de 180 dias está previsto na resolução Conama 01/86. Lembramos que um processo de licenciamento é dinâmico e, à medida que novas demandas, dúvidas e solicitações surgem. Esse prazo é interrompido, especialmente em casos como da UHE Sinop, em que está em análise um projeto complexo e que acarreta grandes impactos ambientais.
Além da EDF, com 51%, são sócias do empreendimento a Eletronorte e a Chesf – cada uma detém 24,5%. Longchamps elogia a Agência Nacional de Águas (ANA), a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). Mas, certo de que 100% das condicionantes foram cumpridas ou estão com o atendimento em dia, diz não entender as razões na demora para o enchimento do reservatório. Se a licença não sair até janeiro, serão “centenas de milhões de reais” em prejuízo, afirma. Ele pretende pedir reconhecimento da Aneel – chamado de “excludente de responsabilidade” no jargão do mercado – de que o atraso na geração de energia não foi culpa da concessionária.N