A prefeitura municipal de Campo Verde recebeu vinte doses de soro antiofídico contra a picada da cobra jararaca, 15 dias após a Defensoria Pública de Mato Grosso solicitar, via ofício, que o Estado e a prefeitura providenciassem a oferta do remédio para a população local. A medida foi tomada para evitar mortes como as da policial penal, Luciene Santos, 44 anos, que faleceu após ser picada pela cobra da espécie, no dia 25 de abril.
No pedido, a defensora pública da comarca, Tânia Vizeu, solicitou doses em quantidade suficiente para atender a população da cidade, onde a incidência da picada da cobra é uma das maiores do país, em decorrência do grande número de assentamentos na zona rural. Campo Verde tem sete assentamentos nos quais vivem mais de 4 mil famílias.
“É uma vitória, agora, temos o soro na cidade. Do contrário, a vítima teria que percorrer 80 km até Jaciara ou 137 km até Rondonópolis, no mínimo, para receber atendimento médico, o que inviabilizava o socorro e colocava a vida de todos os munícipes em risco. Diante disso, é uma grande vitória”, avaliou a defensora.
Tânia protocolou o ofício no dia três de maio e o soro foi entregue à Vigilância Epidemiológica do município na terça-feira (24/5), 15 dias úteis após a solicitação. Luciene foi picada por uma jararaca na zona rural de Campo Verde e levada para Rondonópolis, a 138 km. Mas, ao dar entrada no Hospital Regional de Rondonópolis os médicos disseram que ela já tinha complicações renais e precisava de uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI). No dia seguinte, no entanto, o quadro dela só se agravou, o que a levou a óbito.
A vice-prefeita e secretária de saúde de Campo Verde, Edna Queiroz da Silva, explica que tão logo as doses chegaram uma equipe foi enviada para treinamento sobre como fazer o uso do produto. “Como a quantidade de soro usado depende de como e onde a pessoa é picada, a quantidade de antiofídico que temos pode ser toda usada em uma única pessoa. Porém, assim que usarmos as 20 doses podemos buscar outras”, explicou.
Edna informa que o máximo de doses que uma pessoa pode usar são 20, situação de uma picada muito grave, mas que dependendo do local e de como a cobra picou, a pessoa pode usar até uma única dose. “O importante para nós é que agora temos o socorro aqui. Essa é uma luta de sete anos, fiz vários ofícios solicitando, tive várias negativas, e agora, vencemos essa batalha com a ajuda da Defensoria”, disse.
A defensora pública defendeu no ofício que o fornecimento do soro na cidade é fundamental para salvar vidas, diante das graves estatísticas. Ainda segundo a imprensa local, em oito anos, três pessoas morreram vítimas de picada de cobra e inúmeras ficaram com sequelas causadas pelos ataques.
“Pelos casos e relatos da população, os ataques de jararaca aqui ocorrem em grande número, principalmente na zona rural, e se intensificam nos meses de abril a julho. Tomamos providências para evitar novos registros de morte e que a população fique com sequelas graves por não ter socorro rápido e adequado, como a natureza do problema exige. A eficácia do soro está diretamente ligada à rapidez de sua aplicação após a picada. Qualquer um que more aqui, teme precisar do remédio e ter que viajar quilômetros para tê-lo”, afirmou Tânia na ocasião.
Sentença Ignorada – Uma das vítimas de picada de jararaca em Campo Verde é a criança H. R. T., sete anos, picada pela cobra quando era um bebê de nove meses. H., vive na zona rural de Campo Verde com a família, e sobreviveu graças ao soro antiofídico, disponível à época. Porém, sofreu uma deformidade no dedo indicador da mão esquerda que tende a atrofiar o nervo, permanentemente, caso não seja operado.
A necessidade da cirurgia foi indicada por médicos ortopedistas que atenderam H., em 2017, após a criança ter sido tratada com fisioterapia e outras alternativas, sem conseguir corrigir o problema. Desde então, a mãe do garoto tenta, sem sucesso, que o Sistema Único de Saúde (SUS) providencie a cirurgia para a correção do dedo do filho.
Ação – A defensora Tânia explica que em 2021 foi procurada pela mãe de H., Bruna Santos, com a documentação indicando que, procurou o município em 2017, com guia médico indicando a necessidade da cirurgia para o filho, mas, apenas em 2019 o pedido de cirurgia foi incluído no sistema de regulação do Estado. Como nada foi feito, a Defensoria Pública moveu uma ação de obrigação de fazer, com pedido de liminar em favor da criança.
A liminar favorável a H. foi dada em junho de 2021, pela juíza da 2ª Vara Cível de Campo Verde, Maria Lúcia Prati, que determinou ao Estado e ao município que providenciassem consulta com um cirurgião médico ortopedista, o tratamento cirúrgico, internação em leito de enfermaria e, caso fosse necessário, UTI para o menino. Consultas, exames e medicamentos também deviam ser fornecidos.
Demora – Ambos os entes apelaram da decisão. Mas, na sentença de mérito publicada em agosto de 2021, a juíza determinou que, em 30 dias, o Estado e o município providenciassem todo o atendimento para a criança. Ainda assim, oito meses depois, nada foi feito e a Defensoria teve que pedir o cumprimento da decisão, determinada novamente pela juíza, em abril de 2022. A família continua aguardando.