A luta pelo controle interno independente – Parte 1 – por Isaías Lopes da Cunha

Fonte: Isaías Lopes da Cunha

Isaías Lopes da Cunha
Isaías Lopes da Cunha

No início de sua obra clássica “A luta pelo direito”, Rudolf Von Ihering afirma que o fim do direito é a paz e a luta é o meio para obtê-la, assim, sem luta não há direito.  A vida do direito é a luta: luta dos povos, dos governos, das classes, dos indivíduos etc.

Veja também: A luta pelo controle interno independente – Parte 2

Nos últimos anos, profissionais de controle e suas entidades de classe lutam pela probidade administrativa e estrita observância aos princípios constitucionais da administração pública, principalmente o de acesso e exercício de cargos, empregos e funções públicas após prévia aprovação em concurso público (art. 37, caput, e II, CF).

Apesar do importante e relevante papel do TCE-MT na implantação do SCI dos municípios mato-grossenses, mediante aprovação da Resolução nº 01/2007, das Resoluções  Normativas nº 33/2012 e nº 26/2014 e da Súmula nº 08/2015 que estabelecem, dentre outras diretrizes, que as atividades de controle interno devem ser exercidos por servidores públicos efetivos, ainda hoje, servidores ocupantes de cargos exclusivamente comissionados de controlador interno ou de controlador geral realizam essas atividades em alguns órgãos públicos.

A fiscalização contábil, orçamentária, financeira, operacional e patrimonial dos órgãos e entidades públicas (art. 70, caput, CF), especialmente, de comprovar a legalidade e avaliar os resultados da gestão orçamentária, financeira e patrimonial dos órgãos e entidades públicas (art. 74, II, CF), requer aplicação de conhecimentos técnicos de Contabilidade e de Direito, sendo, portanto, uma atividade eminentemente técnica.

Por ser uma função relevante para a Administração Pública, o Legislador Constitucional regulou a responsabilidade dos dirigentes dos órgãos de controle interno no art. 74, § 1º, da Lei Maior, que preconiza: “Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária”.

Nesse contexto, o STF declarou inconstitucionais as leis de entes federativos que criam cargos comissionados de auditor de controle interno (ADI  3602/GO) e de diretor de controle interno e de controlador interno (RE 1264676/SC).

Reafirmando a sua jurisprudência sobre cargos em comissão no RE  1041210/SP, a Suprema Corte fixou a seguinte tese:

  1. a) A criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais;
  2. b) tal criação deve pressupor a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado;
  3. c) o número de cargos comissionados criados deve guardar proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os criar; e
  4. d) as atribuições dos cargos em comissão devem estar descritas, de forma clara e objetiva, na própria lei que os instituir.

Nessa esteira, as principais lutas da Associação dos Auditores e Controladores Internos dos Municípios de Mato Grosso (AUDICOM-MT) são a criação e o provimento de cargos efetivo de auditor ou controlador interno por meio de concurso público e o exercício de cargos em comissão de direção e chefia nas unidades de controle interno por servidor efetivo da carreira de controle interno.

Das setes ADIs ajuizadas pela AUDICOM-MT, nas duas primeiras, o TJMT declarou inconstitucionais as leis que criaram cargos comissionados de auditor geral e auditor interno (N.U.1010030-36.2019.8.11.0000) e de controlador geral, coordenador de controle interno e gerente de auditoria (N.U.1014296-32.2020.8.11.0000) por ofensa ao princípio da investidura e ausência de atividades de direção, chefia e assessoramento (art. 37, II e V, da CF).

A questão central que permeia todas essas ações é que os cargos em comissão, declarados por lei de livre nomeação e exoneração, possui natureza precária e transitória, por isso não coaduna como função de fiscalização dos atos de gestão, especialmente, os da autoridade nomeante, por não garantir independência funcional aos dirigentes dos órgãos de controle interno e porque suas atribuições são eminentemente técnicas e permanentes.

Por outro lado, as controladorias internas fazem parte da estrutura da Administração Pública, a qual é organizada de forma hierárquica, necessitando dessa maneira também de cargos em comissão de direção e chefia nesses órgãos, dentro dos contornos constitucionais, para dirigir, planejar e supervisionar as atividades de controle e auditoria interna, bem como para representar a instituição e exercer os poderes administrativos.

Diante desse imbróglio, umas alternativas jurídicas são a vinculação dos cargos em comissão de direção e chefia aos integrantes da carreira de controle interno por meio de lei e a interpretação pelo Poder Judiciário de que os ocupantes desses cargos são os responsáveis pelo controle interno (art. 74, §1º, CF) e, por isso, somente podem ser providos por auditores ou controladores internos de carreira.

Isaías Lopes da Cunha é Auditor Substituto de Conselheiro do TCE-MT

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