A Rede Xingu+, o Instituto Kabu e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), representantes da sociedade civil no Grupo de Trabalho (GT) criado para discutir o traçado da Ferrogrão, anunciaram na segunda-feira (29) o rompimento com o grupo. As entidades alegam que o espaço não tem cumprido sua função de diálogo e que as decisões estão sendo tomadas sem a devida consulta às partes interessadas.
Em uma declaração oficial enviada ao Ministério dos Transportes (MT), responsável pelo projeto, o grupo destacou que a pasta avançou com estudos sem consultar os membros do GT. Além disso, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) já incluiu a ferrovia no cronograma de leilões para 2025, uma decisão que ignorou as preocupações levantadas pela sociedade civil.
“O que deveria ser um espaço de diálogo transversal e interministerial terminou esvaziado […]. O que deveria ser um espaço com participação da sociedade, dependeu da mobilização logística das próprias organizações e movimentos para assegurar suas presenças. E o que deveria ser um espaço de debates profundos, terminou sendo um ambiente secundarizado e sem ressonância nos processos de tomada de decisão,” diz trecho da declaração oficial.
Entenda o Projeto Ferrogrão
O projeto Ferrogrão visa a construção de uma ferrovia longitudinal que conecta Sinop (MT) a Itaituba (PA), destinada ao escoamento de produtos agrícolas da região Centro-Oeste para os portos do Norte. Contudo, o projeto enfrenta forte oposição devido aos potenciais impactos ambientais e sociais que pode causar.
O projeto é alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou, em 2023, a criação do Grupo de Trabalho para avaliar os impactos da ferrovia. No entanto, as organizações da sociedade civil expressaram frustração com o andamento das discussões no GT.
“Depois de nove meses desde nossa primeira reunião, atesta-se que este GT, criado pela Portaria 994/2023, não cumpre seu papel […] Juntamente com a Aliança #FerrogrãoNão, manifestamos nossa discordância e profunda preocupação pelo tratamento dado ao tema. Não mediremos esforços para barrar esses trilhos de destruição e seguiremos os diálogos com o governo federal de outras maneiras e em outras instâncias,” afirmam as organizações.
Impactos ambientais e sociais alarmantes
As críticas ao projeto Ferrogrão são centradas em um suposto passivo ambiental e fundiário significativo na região. As organizações destacam que o projeto original apresenta falhas nos estudos de impacto ambiental, não considera os efeitos sinérgicos e cumulativos e ignora o direito de consulta aos povos e comunidades afetadas.
O traçado planejado para a ferrovia atravessa o Parque Nacional de Jamanxim e corta as bacias dos rios Xingu e Tapajós. Segundo organizações indigenistas, a construção da ferrovia poderá afetar diretamente 19 povos indígenas. Além disso, estimativas apontam que o projeto resultará no desmatamento de mais de 2 mil km² de floresta primária e impactará cerca de 4,9 milhões de hectares de áreas protegidas.
A importância da Rede Xingu+ e do Instituto Kabu
A Rede Xingu+ é uma aliança política composta por 32 organizações que representam povos indígenas, comunidades tradicionais do Xingu e entidades da sociedade civil que operam em Terras Indígenas e Unidades de Conservação na bacia do Rio Xingu. Este grupo atua no chamado Corredor Xingu de Diversidade Socioambiental, promovendo a defesa do meio ambiente e das populações tradicionais da região.
O Instituto Kabu, por sua vez, é uma organização indígena que congrega 12 aldeias nas Terras Indígenas (TIs) Baú e Menkragnoti, localizadas no sul do Pará. Ambas as organizações têm desempenhado papéis cruciais na luta contra o projeto Ferrogrão, destacando os potenciais impactos ambientais e sociais que a ferrovia poderia trazer.
O rompimento com o Grupo de Trabalho não significa o fim dos esforços das organizações para bloquear o avanço da Ferrogrão. A Rede Xingu+, o Instituto Kabu, o PSOL e outros parceiros da Aliança #FerrogrãoNão estão comprometidos em buscar alternativas para garantir que as vozes das comunidades afetadas sejam ouvidas e respeitadas. Eles continuam a explorar outras vias de diálogo com o governo federal, buscando soluções que não comprometam o meio ambiente e as populações locais. A resistência ao projeto Ferrogrão destaca a importância de uma abordagem responsável e inclusiva para o desenvolvimento de infraestrutura no Brasil.