A dona de casa Rosa Neves, de 92 anos, morreu com o novo coronavírus 19 dias após receber uma homenagem do Hospital Municipal Evandro Freire, na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio, por ter supostamente se curado da doença.
A informação de que ela estava com Covid-19 quando morreu está no atestado de óbito da idosa, que faleceu na última segunda-feira (20) em um hospital em Duque de Caxias.
No dia 1º de julho, Rosa recebeu uma placa dizendo “Eu venci a Covid” após receber alta médica no Evandro Freire, mas a família diz que nunca recebeu o laudo do exame atestando a cura.
Neto de Rosa, Ricardo Pereira dos Santos acredita que a avó entrou no hospital apenas com mal-estar e saiu da unidade contaminada.
“Eu acredito que ela tenha se contaminado no hospital. Tenha trazido isso do hospital, da primeira vez. Até o momento que ela foi se internar, ela estava isolada completamente. Ela, meu avô e minha tia não recebiam a visita para ninguém. Eu trazia a compra e deixava na porta de casa. Eu nem entrava”, disse o neto.
Após receber a idosa em casa, outros quatro familiares apresentaram sintomas e testaram positivo para a doença. Entre eles, o marido de Dona Rosa, Edvaldo Pereira dos Santos, 93 anos.
“É desesperador, a gente fica sem saber o que aconteceu. Eu acho que ela pegou a primeira vez no hospital. Ela entrou e não tinha. Eu creio que ela pegou antes de ela sair do hospital. Tenho quase toda certeza. Porque aqui na família a gente não tinha nenhum caso. Eu acho que ela acabou transmitindo para a gente”, contou Eliene Pereira dos Santos, filha do casal.
A família contou que Rosa Neves sentiu febre e procurou atendimento no Hospital Evandro Freire. Apesar de, segundo a família, não apresentar qualquer resultado positivo de testes para Covid-19, o hospital iniciou o tratamento. Oito dias depois, a idosa recebeu alta médica com homenagens, placa e balões da equipe médica.
Os familiares chegaram a fazer um teste, em clínica particular, no mesmo dia em que ela recebeu alta, 1º de julho. O resultado foi negativo para Covid-19. Mas os parentes acreditam que ela estava recém-infectada e o laudo não constatou a doença.
Dias depois, já em casa com a família, Rosa Neves voltou a se sentir mal e procurou o hospital. Os médicos informaram a família que novamente era Covid-19 e ela teria que ser internada. Um dia depois, a paciente — diagnosticada com Alzheimer e supostamente Covid — foi transferida para o Hospital São José, no município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, sem que a família fosse avisada.
“Minha avó foi transferida, a gente só ficou sabendo porque a gente foi até o hospital. Se não, eu acho que nem isso a gente ia ter. Fomos até o hospital, recebemos a informação da transferência e eles nem sabiam para onde ela tinha ido. Eu joguei no Google ‘hospital de campanha para o tratamento de Covid’. Achei o Hospital São José e fui para lá na cara e na coragem. Fui para ver se ela estava lá”, disse o neto Ricardo.
Após ficar internada nove dias no Hospital São José, em Duque de Caxias, Rosa Neves morreu. Depois que ela foi para casa, supostamente curada, quatro pessoas de sua família apresentaram sintomas e testaram positivo para a doença.
O que dizem os citados
A Secretaria Municipal de Saúde (SMS) confirmou que a paciente de 92 anos, com Alzheimer e supostamente Covid-19 foi transferida — do Hospital Evandro Freire, na Zona Norte do Rio, para o Hospital Municipal São José, na Baixada Fluminense — sem que a família fosse avisada. A SMS informou que “lamenta e pede desculpas aos familiares”.
A pasta informou ainda que os resultados dos exames ficam à disposição da família, apesar de a filha e do neto da paciente terem informado ao G1 que não receberam nenhum laudo.
O órgão, em nota posterior (veja a íntegra abaixo), disse ainda que não é possível saber onde a idosa foi infectada e que seguiu todos os protocolos no tratamento, inclusive os prazos para a alta.
A Secretaria Municipal de Saúde e Defesa Civil de Duque de Caxias informou que a paciente deu entrada no hospital dia 13 de julho e foi realizado exame de tomografia de tórax, que evidenciou “acometimento pulmonar de 30 a 50%, necessitando de oxigênio”.
A paciente teve “piora progressiva clínica e respiratória, sendo necessário intubação orotraqueal e ventilação mecânica”. Dona Rosa morreu no dia 20 de julho.
Nota da Secretaria Municipal de Saúde do Rio
A direção do Hospital Municipal Evandro Freire não soube da morte da paciente, internada em Duque de Caxias, mas se solidariza com a família nesse momento de dor.
A direção da unidade compreende as dúvidas da família, mas deixa claro que todos os protocolos foram seguidos e não é possível avaliar onde a Dona Rose foi infectada. Cabe lembrar que há mais de três meses foi decretada a transmissão comunitária da Covid-19 no Rio – quando é impossível saber a origem do contágio.
Dona Rosa deu entrada no Hospital Municipal Evandro Freire no dia 24 de junho, apresentando sintomas compatíveis com Covid-19, como comprometimento dos pulmões. Exames realizados, incluindo tomografia, indicavam que ela poderia estar infectada pelo vírus e, diante disso, foi tratada como paciente com suspeita da doença. O tratamento de Dona Rosa seguiu rigorosamente o protocolo do Ministério da Saúde – que determina que todo caso suspeito seja tratado como tal, independente do resultado do exame específico para detectar o vírus.
A paciente teve alta sete dias depois da internação porque apresentava melhora em seu quadro clínico e já tinha completado 14 dias do início dos sintomas. Durante o tempo em que ficou no Evandro Freire, Dona Rosa esteve internada na enfermaria- local destinado aos pacientes com quadros menos graves.