Casos recentes de violência extrema contra mulheres em São Paulo reacenderam o alerta sobre o avanço do feminicídio no país. Em um dos episódios, uma mulher de 31 anos foi atropelada e arrastada por cerca de um quilômetro, resultando na amputação das pernas. Em outro, uma trabalhadora foi baleada pelo ex-companheiro dentro da pastelaria onde atuava.
O delegado responsável pelo primeiro caso classificou o crime como tentativa de feminicídio, destacando a impossibilidade de defesa da vítima e a brutalidade do ataque. A vítima permanece internada.
A advogada Luciane Mezarobba, especialista em atender mulheres, afirma que o enfrentamento ao problema deve ocorrer simultaneamente na esfera pública e privada. Ela aponta que políticas afirmativas, investimentos em creches e escolas integrais e ações antidiscriminatórias são essenciais para mitigar desigualdades estruturais.
Mezarobba destaca ainda o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, implementado pelo CNJ, como ferramenta importante para orientar decisões judiciais. Segundo ela, a legislação brasileira já prevê punições severas, mas a sensação de impunidade e o ambiente de misoginia contribuem para a continuidade das agressões.
No âmbito familiar, a advogada reforça a necessidade de uma educação que rompa com padrões machistas e distribua responsabilidades de forma igualitária. Estereótipos que colocam as mulheres no espaço doméstico e os homens no espaço público devem ser enfrentados dentro dos lares.
Desigualdade histórica
A psicóloga e pesquisadora da UnB, Maisa Guimarães, explica que a desigualdade de gênero no Brasil foi legitimada durante séculos por normas sociais e legislações, o que mantém raízes profundas no presente. Ela lembra que apenas a partir do final da década de 1960 mulheres casadas passaram a ter autonomia legal para decisões básicas, como escolher sua profissão.
Essa herança patriarcal ainda influencia a forma como casos de violência acontecem e são percebidos, sobretudo quando o agressor é alguém do convívio da vítima.
A Lei Maria da Penha define diferentes tipos de violência doméstica — física, psicológica, sexual, patrimonial e moral — e especialistas alertam que as agressões tendem a escalar quando não há intervenção imediata.
Recorde de feminicídio em SP
Dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo mostram que a capital registrou 53 feminicídios entre janeiro e outubro de 2025, o maior número da série histórica iniciada em 2018. No estado, 207 mulheres foram mortas desde janeiro, além de mais de 5,8 mil casos de lesão corporal dolosa registrados apenas em outubro.
Pesquisadores afirmam que a adoção de protocolos de investigação mais eficientes tem reduzido a subnotificação, tornando o cenário mais visível. No entanto, o aumento dos registros também aponta agravamento da violência, impulsionado por comportamentos de controle e rejeição à autonomia feminina.
Feminicídio é a forma mais extrema da violência de gênero e, no Brasil, a pena pode chegar a 30 anos. Especialistas alertam que muitos casos são o desfecho de ciclos prolongados de agressões, marcados pela sensação de domínio e posse sobre a vida das mulheres.





















