Em Mato Grosso, duas pessoas foram infectadas com o vírus HIV todos os dias ao longo do ano de 2017. A média no ano seguinte é de 1,6 pessoa infectada por dia. Foram 1.478 casos durante os dois anos. Como método de prevenção à infecção, o Ministério da Saúde oferta uma Profilaxia Pré-Exposição. A PrEP consiste na tomada diária de um comprimido que impede que o vírus infecte o organismo. O método ainda é desconhecido por grande parte da população, mas já está disponível através do Sistema Único de Saúde (SUS), em Mato Grosso desde 2018. O objetivo é contribuir para o alcance das metas relacionadas ao fim da epidemia até 2030.
A infectologista e professora do Centro Universidade de Várzea Grande (Univag), Giovana Volpato Pazin, explicou que a PrEP é uma das opções de prevenção ao HIV. “Hoje quando a gente fala em prevenção de HIV, a PrEP é uma das opções que a gente tem para fazer a prevenção. O Ministério da Saúde tem uma política, que seria 90, 90,90. Eu tenho 90% das pessoas diagnosticadas, 90% das pessoas diagnosticadas em tratamento e, 90% dessas pessoas em tratamento, com o retroviral funcionando bem”.
“Teoricamente se eu fizer tudo isso, eu consigo bloquear a disseminação da doença e consigo melhorar a incidência. Dentro do programa de prevenção, além desta questão de melhorar adesão e tratamento, a gente tem outras coisas que é estimular a testagem para o HIV, estimular uso de preservativo, fazer orientação, trabalhar número de risco. A PrEP entra no meio dessa política de controle e prevenção da infecção pelo HIV”, ponderou.
Atualmente, o método é indicado para pessoas que tenham maior chance de entrar em contato com o HIV. São elas: Gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH), Pessoas trans, Trabalhadores (as) do sexo. “Por um tempo a gente falou que não existia população de risco para HIV. Hoje a gente sabe que tem uma população de risco. Teoricamente para você usar PrERP você precisa estar dentro deste risco.”, acrescentou.
A PrEP é a combinação de dois medicamentos (tenofovir + entricitabina) que bloqueiam alguns “caminhos” que o HIV usa para infectar seu organismo. Entretanto, a PrEP não protege de outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (tais como sífilis, clamídia e gonorreia) e, portanto, deve ser combinada com outras formas de prevenção, como a camisinha.
Disponível em Mato Grosso
Os Serviços de Assistência Especializada (SAE) são as unidades responsáveis pelos atendimentos desses pacientes. Atualmente as unidades básicas ou centros de testagens e aconselhamento realizam a testagem e encaminham ao SAE de sua referência para continuidade dos exames e tratamento. Em Mato Grosso há disponibilidade de 25 SAE’s implantados, sendo pelo menos um serviço em cada regional de saúde, faltando somente na região de São Felix do Araguaia e Pontes e Lacerda.
Em geral os médicos especialistas que atendem as pessoas vivendo com HIV e Aids são os infectologistas e ginecologistas, por causa da gestante HIV. No entanto, a Secretaria do Estado e Saúde (SES) afirmou que hoje é difícil precisar o número de profissionais especializados visto que existem atendimentos feitos no sistema particular. O Ministério da Saúde tem protocolos específicos para tratamento da pessoa vivendo com HIV e Aids o que facilita a condução do tratamento.
Atualmente o Ministério da Saúde já define que o atendimento ao paciente pode acontecer na unidade básica de saúde, inclusive já existe municípios estabelecendo essa estratégia e os SAE’s atua como matriciador. Os diagnósticos já acontecem nas unidades básicas de saúde, pois com a introdução dos testes rápidos (HIV, sífilis e hepatites) facilitou muito a ação de diagnóstico.
Em relação ao tratamento, ele ainda se encontra centralizado nos SAE’s. O estado ainda enfrenta muitos problemas em relação ao estigma e discriminação da doença, sendo muito maior no interior. Com isso, a população dessas regiões busca muito os serviços da capital para que não sofram discriminação ou rotulação nas suas cidades. Com isso o resultado é uma concentração de maior de demanda na capital, onde há três serviços de referência na capital e um em Várzea Grande.
Funcionários carecem de preparo
Mato Grosso iniciou a organização para a implantação da PrEP em fevereiro de 2018. Hoje há cinco SAE’s que disponibilizam essa profilaxia, sendo eles: SAE Cermac, SAE Rondonópolis, SAE Cuiabá, SAE Sinop e SAE Várzea Grande. Segundo a SES, até o momento, há informações de apenas 30 usuários em utilização da PrEP em todo Estado, sendo cinco em Cuiabá.
O SAE do bairro Grande Terceiro é um dos que oferta o medicamento. Quem procura por atendimento no local reclama da falta de preparo por parte dos funcionários. “O atendimento foi péssimo, elas falavam com você como se tivessem querendo te convencer a não tomar, meio que te “culpando” por estar querendo o medicamento, mas eu não desisti”, relata o jovem *Eduardo, de 27 anos.
Eduardo conta ficou sabendo que a PrEP já era usada fora do País e em outras regiões do Brasil, como no Sudeste. Através de um colega, ficou sabendo da disponibilidade na Capital e procurou o SAE do bairro Grande Terceiro. Entre o primeiro contato com os profissionais da unidade até a entrega do medicamento, Eduardo esperou cerca de um mês.
“Falaram que eu devia conversar com a psicóloga, que atendeu de uma forma muito melhor. Falei de novo com a enfermeira, que pediu os exames. Eu fiz os exames de sangue e os testes rápidos de DST. Para os de sangue eu tive que agendar um dia para fazer, então depois que falei com elas esperei alguns dias para fazer o exame”, lembra.
“Depois que fiz o exame esperei duas semanas para pegar o resultado e retornei ao posto de saúde. A enfermeira olhou os resultados e agendou consulta com o médico do posto, no final da semana falei com ele, que então me prescreveu a PrEP”, acrescenta.
No entanto, ao ir buscar o medicamento na data prevista, teve mais problemas. “Fui à farmácia do posto e a pessoa que estava atendendo na hora não podia me dar a PrEP, porque não tinha sido treinada. Descobri que só duas pessoas no posto tinham o treinamento para os procedimentos da PrEP. Tive que retornar depois ao posto, conversei com a enfermeira que teve que fazer meu cadastro em um site, para depois eu conseguir receber a PrEP”.
“Neste mês, quando retornei, tive outro problema, no mês passado quando peguei pela primeira vez só me disseram para retornar um pouco antes de acabar o medicamento, para pegar mais. Fui lá e descobri que eu deveria ter retornado com mais um exame de sangue feito, mas ninguém tinha me dito isso”, reclama.
O jovem acredita que falta treinamento por parte dos funcionários. “Eles mesmos não sabem muito bem como é o protocolo, como devem fazer, é muita bagunça e burocracia. A impressão que tive é que estão muito despreparados”, afirma.
Sobre capacitação de profissionais na PrEP, a SES informou que estão previstos para o mês de maio, a qualificação em oito SAEs: Canarana, Alta Floresta, Cáceres, Juara, Juína, Confresa, Tangará da Serra e Barra do Garças, que será realizada em conjunto com a Secretaria Municipal de Saúde de Rondonópolis.
Divulgação
Embora o medicamento tenha eficácia comprovada e quase nenhum efeito colateral (apenas risco é a alteração da função renal), a PrERP é desconhecida por muitas pessoas da área de risco e quase não se vê divulgação por parte do Ministério da Saúde. Eduardo salienta que poucas pessoas de Cuiabá sabem do medicamento.
“Várias vezes tive que explicar para pessoas que me perguntaram o que era. Tem muita falta de informação. Mas também tem muita gente que sabe o que é, mas não entende como funciona, eu imagino. Porque já conversei com vários caras que disseram que tomavam, mas não bate com o número de pessoas que usam, aí estes caras me disseram que já usaram algumas vezes”.
O Ministério da Saúde alerta que a PrEP só tem efeito se você tomar os comprimidos todos os dias. Caso contrário, pode não haver concentração suficiente do medicamento em sua corrente sanguínea para bloquear o vírus. Além disso, ela começa a fazer efeito após uso de sete dias para relação anal e 20 dias de uso para relação vaginal.