A psicanalista Adriana Rangel, que é doutora em psicologia e professora na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), desenvolve um trabalho social que trata a saúde mental dos moradores de rua que vivem no Beco do Candeeiro e no Morro da Luz, no Centro de Cuiabá.
O projeto ‘Psicanálise na Rua’ começou como uma tese de doutorado há três anos e teve continuidade como uma ação social, a qual oferece gratuitamente acompanhamento aos moradores de rua.
A professora trabalhava em um programa social e teve o desejo de tratar o problema com as drogas da população de rua. ”Eu era supervisora do CAPS (Centro de Assistência Psicossocial) estadual e comecei a acompanhar o trabalho. No início do meu doutorado, estava muito interessada em tratar a toxicomania dessa população de rua”, explicou.
O trabalho era desenvolvido como uma ‘escuta’ para ouvir as histórias dos moradores de rua. A psicanalista ficava sentada no chão, sobre um pedaço de papelão, e dispunha de chá e bolacha.
”Comecei a fazer um trabalho semanal para escutar essa população. Eu ia para lá (Beco do Candeeiro) com chá, bolacha e ‘a cara e a coragem’. Ficava lá, conhecendo-os, andava com eles pela cidade, ouvindo as histórias deles e nisso começou o trabalho do Psicanálise na Rua e se tornou minha tese de doutorado para pensar como eu poderia fazer isso de escuta clínica”, disse Adriana.
O Psicanálise na Rua funciona como um consultório público e dispõe de um tratamento com a mesma metodologia do que é oferecido nas clínicas particulares.
Adriana contou que, quando começou a ter contato com os moradores de rua e a criar esse vínculo de escuta, percebeu o quanto eles se sentiam segregados, o quanto eram humilhados. Na avaliação dela, a vulnerabilidade social ligada ao sofrimento dessa população é mais forte do que o sofrimento com a droga.
Conforme a doutora, essas pessoas apresentam dificuldades para ser tratadas nas clínicas e que a maioria são jovens em torno de 30 anos e com doenças graves, como sífilis, tuberculose e aids.
”A maior parte deles está tuberculoso, aidético e sifilítico. Nós estamos tentando comprometer a saúde pública a sustentar o tratamento deles, pois é uma população difícil de tratar também nas epidemias básicas”, disse Adriana.
A doutora já se contaminou com tuberculose no final do primeiro ano de trabalho, em 2017, e mesmo assim deu sequência ao projeto.
Há quase um ano, ela montou um consultório. Alugou um imóvel próximo do local onde o trabalho social começou e disponibiliza atendimentos diários durante a semana. O tratamento é feito com profissionais capacitados e que são voluntários.
Atualmente, o projeto conta com uma equipe de 12 profissionais habilitados em psicologia, consultório local e se mantém com recursos próprios. Atendem quase todos os dias da semana, no período da manhã e da tarde.
A idealizadora do projeto quer criar uma fundação para conseguir se sustentar, pois poderá participar de editais do governo federal. Vai se chamar Fundação Tereza Benguela, que está nos trâmites legais para criação.
Tereza Benguela
Tereza de Benguela viveu na região do Vale do Guaporé e foi uma líder quilombola. Após a morte do marido, passou a liderar a comunidade, resistindo bravamente à escravidão por mais de 20 anos. Ela comandou a estrutura política, econômica e administrativa da comunidade, enfrentando diversas batidas da Coroa Portuguesa. Teresa de Benguela sobreviveu até meados da década de 1770, quando o quilombo foi destruído pelas forças do então governador da capitania.
* Sob a supervisão de Pollyana Araújo