Acreditando na reconstrução da identidade da vítima de violência doméstica, a Delegacia Especializada de Defesa da Mulher de Cuiabá (DEDM), da Polícia Judiciária Civil, lançou nesta semana o projeto “Ainda Posso Sonhar”, com objetivo de proporcionar atendimento às mulheres que apresentaram sequelas psicológicas em decorrência de um relacionamento violento com o parceiro
O projeto realizado por meio de terapias em grupo direcionadas às vítimas de violência doméstica busca trazer esperança às mulheres que procuram a Delegacia da Mulher, e que, após serem agredidas, seja de forma física, moral, psicológica, sexual ou patrimonial, econômica, não conseguem enxergar um novo futuro.
As terapias são voltadas para que a vítima trabalhe a autoestima, autoafirmação e encontre um novo sentido para a vida, o que a Delegacia da Mulher chama de reconstrução da identidade. Entre outros fatores, o trabalho buscará com que a vítima volte a se amar, antes de amar outra pessoa, e desta forma não entre em um novo relacionamento abusivo.
A primeira turma é formada por 20 mulheres que já passaram por atendimento da Delegacia Especializada. As vítimas cadastradas participarão de 10 sessões de terapia em grupo, que serão realizadas até dezembro deste ano. As reuniões em grupo acompanhadas por uma psicóloga serão realizadas uma vez por semana, em uma sala na delegacia. A previsão é de que uma nova turma seja formada em 2020.
A delegada titular da DEDM, Jozirlethe Magalhães Criveletto, pontua que o trabalho é uma iniciativa da unidade policial na busca por auxiliar as mulheres vítimas de violência, para que elas entendam que ainda podem fazer projeções para o futuro e mudar a história de cada uma.
“Esse atendimento é uma ansiedade que tínhamos há muito tempo, porém, não contávamos com profissionais especializados para realização do trabalho. Este ano, a Delegacia da Mulher foi agraciada com profissionais de psicologia, que passaram a integrar o setor de acolhimento às vítimas e que também enxergaram essa necessidade”, disse a delegada.
Atuando à frente do projeto, a psicóloga Eliane Montanha Rojas explica que quando a mulher passa por uma situação de violência, o primeiro passo é assumir que está sendo vítima e procurar por ajuda, uma vez que nem todas conseguem enxergar que estão sendo submetidas a diferentes tipos de agressões.
Segundo a psicóloga, algumas vítimas negam a situação para si mesmas, porque não se sentem preparadas para a separação, devido à cultura patriarcal, em que a mulher tem a posição de submissão e de responsável por manter a família.
“O violador, geralmente, não começa a agredir a vítima com lesões, que já é um estágio avançado. A violência inicia quando o agressor começa a ultrapassar limites, seja moral, psicológico, sexual, patrimonial, ou econômico, sem que a mulher perceba. O segundo passo da vítima é superar os traumas causados, o que é o objeto de trabalho do projeto”, afirma Eliane.
O delegado regional de Cuiabá, Rodrigo Bastos, esteve presente no lançamento do projeto e destacou o pioneirismo do trabalho desenvolvido pela Delegacia da Mulher de Cuiabá. “É uma unidade de referência na defesa dos direitos da mulher, que traz um projeto inovador, mostrando que a Polícia Civil, junto ao Governo do Estado, está empenhada em avançar nesse tema tão importante que é o combate a violência doméstica”, disse.
O delegado titular da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher Criança e Idoso de Várzea Grande, Cláudio Alvares Sant’Ana, ressaltou que o projeto é inovador, uma vez que muda o paradigma da Polícia Civil de que o atendimento à vítima é apenas instaurar o inquérito policial e prender o agressor.
“É uma mudança de percepção, em que é possível verificar a importância do atendimento psicológico e mental da vítima. A violência, seja um xingamento ou uma ameça, traz danos a imagem e a alma da mulher, que só prender o agressor não vai curar”, disse o delegado.
Estatísticas da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp-MT) apontam que de janeiro a setembro deste ano foram registradas 3.212 ocorrências de ameaça contra vítimas femininas (18 a 59 anos). No mesmo período, foram registrados 349 casos de injúria e 771 ocorrências de difamação.
Conforme Jozirlethe, a Delegacia da Mulher de Cuiabá atende cerca de 20 vítimas de violência doméstica por dia, e até então, o que era oferecido a essas mulheres era apenas o trabalho de competência da Polícia Civil, como investigação, medida protetiva e punição ao agressor.
“Porém, essas vítimas não recebiam o futuro diferente que elas vinham buscar. É um grande desafio essa nova área de atuação, mas entendemos que aqui é uma casa de acolhimento e com muito amor vamos oferecer à vítima a oportunidade de seguir um futuro melhor”, reforçou a delegada.