Os reeducandos do Centro de Custódia da Capital (CCC) agora têm um espaço de trabalho adequado para produção de cadeiras, bancos e mesas em fibra sintética. Antes da inauguração, realizada nesta sexta-feira (26.04), eles atuavam em corredores e espaços improvisados. Tanto o projeto quanto a construção foram feitos pelos próprios recuperandos. Já a aquisição de materiais para a obra, no valor de R$ 20 mil, foi viabilizada pela destinação de recursos de transação penal, por meio da 2ª Vara Criminal de Cuiabá, e da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Mato Grosso (OAB-MT).
A.J.S.C., que está no CCC há dois anos e dois meses, vê no novo espaço a oportunidade de ampliar o trabalho que aprendeu dentro da unidade. “Vai fazer um ano que comecei a fazer as cadeiras, e é muito importante para mim, porque trabalhar ocupa a mente. Ficar aqui dentro sem fazer nada é muito ruim, os dias demoram mais a passar, sem contar que é uma nova habilidade que se aprende”, afirma ele, que é formado em Gestão Pública.
O trabalho manual também é uma forma que os reeducandos encontram de estreitar os laços com familiares, já que podem comercializar os móveis artesanais e até presentear em datas comemorativas. Os valores variam de R$ 70,00 a R$ 150,00, e a aquisição pode ser feita diretamente na unidade prisional. O dinheiro arrecadado é revertido na compra de materiais para novos produtos. Além disso, também fazem reformas em cadeiras velhas ou com defeitos.
De forma gratuita, os reeducandos passaram a fazer reparos nas cadeiras do Lar dos Idosos da capital. Segundo S.S.J., de 37 anos, é um trabalho gratificante. “Além de aprender um novo ofício, estamos ajudando o próximo, e também podemos ajudar o sistema carcerário, reduzindo custos com a nossa mão de obra”. Formado em Administração e em Gestão de Pequenas e Médias Empresas, ele ressalta que vai sair da unidade com uma “cabeça diferente, preparado para fazer outras coisas fora da minha área, se precisar”.
Projeto no papel
Este é o terceiro projeto que o reeducando R.S., há apenas nove meses no Centro de Custódia, elaborou e executou a obra. Com 25 anos de formação em Engenharia Civil, ele já trabalha em outros dois projetos futuros, sem utilizar programa de computador, somente com caneta e papel A4. “Tudo foi elaborado de acordo com as normas brasileiras de construção civil e também com as especificidades do código de execução penal. E com o apoio da direção estou conseguindo colocar meus conhecimentos em prática e contribuir”.
O diretor do CCC, Ewerton Santana, frisa que o espaço de trabalho é importante para desmistificar a visão que as pessoas têm da unidade. “Muitos pensam e até falam que o Centro de Custódia só serve para abrigar presos ilustres e passar o tempo, mas não é verdade, porque há oportunidades de trabalho e de capacitação”.
O secretário adjunto de Administração Penitenciária, Emanoel Alves Flores, destaca que a humanização do sistema é uma das principais preocupações da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp-MT). “Além da segurança das unidades, que é algo prioritário, precisamos continuar desenvolvendo ações como esta, que asseguram a dignidade às pessoas privadas de liberdade”.
Parceiros
O pedido à 2ª Vara Criminal de Cuiabá para a destinação de recursos oriundos de transações penais foi feito pela OAB-MT, que também manifestou interesse em ampliar a parceria com o objetivo de aumentar o espaço e adquirir as fitas que os reeducandos utilizam. “Vimos esta possibilidade e procuramos o juiz Geraldo Fidelis, que prontamente acatou a ideia. Estamos felizes de contribuir com a garantia da dignidade humana aos recuperandos e também aproveitar a mão de obra em prol do estado”, disse André Stumpf, da OAB.
O presidente da Comissão de Direito Carcerário da OAB-MT, Waldir Caldas, endossou. “O trabalho é um elemento primordial para a garantia de cidadania ao indivíduo. Nosso desafio é mudar a realidade de reincidência ao crime, e oferecer condições dignas é fundamental para isso”.