O relatório produzido pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) traz à tona diversos casos de maus tratos em cuidados a indígenas em Mato Grosso. O documento aponta dois casos chocantes que aconteceram no Estado. O primeiro é o de uma mulher da etnia Tapirapé, que teve uma fralda de um metro esquecida dentro dela após uma cesariana. Somente depois de retornar três vezes ao hospital que o erro foi percebido. Em outra situação, uma adolescente foi internada com mais de 20 larvas de mosca na boca.
Segundo o depoimento de um dos pais da vítima, a indígena Léia Pawygoo Tapirapé foi submetida a uma cesariana, em Confresa (1.167 quilômetros de Cuiabá), em setembro do ano passado. Quando voltou para a aldeia, começou a passar mal, pois o corte da cirurgia infeccionou. Por duas vezes ela foi levada ao hospital e medicada com antibióticos.
Além disto, a família foi repreendida porque não estaria cuidando bem da mulher. Foi somente na terceira volta ao hospital que um médico plantonista descobriu o problema com a indígena. De dentro dela, foi retirada uma a fralda asséptica com cerca de um metro de comprimento, deixada pelo médico que havia feito a cirurgia de cesariana.
Em outro caso, um adolescente do município de Nova Lacerda foi internada no Hospital Regional de Cacoal com mais de 20 larvas de moscas na boca. Ela tem deficiência e vive numa Casa de Saúde Indígena (Casai). O descaso em relação à saúde da criança foi tão alarmante que o pediatra do hospital onde ela estava internada afirmou ser desumano o que viu, e que teria ficado profundamente tocado. O Ministério Público Federal (MPF) abriu investigação e apurava os responsáveis pelo caso.
Na cidade de Comodoro, em outubro do ano passado, indígenas da Aldeia Central Mamaendê, com mais de 30 famílias, denunciaram o descaso da Sesai pela falta de infraestrutura sanitária. As lideranças indígenas relataram ainda desassistência às gestantes no acompanhamento do pré-natal, pela dificuldade de comunicação entre o polo base da Sesai e a comunidade.
Em Porto Espiridião, um indígena que estava preso tinha ferida nas suas pernas que não saravam com medicamentos. Além disto, havia dificuldades em se fazer exames adequados, devido à falta de estrutura para transportá-lo até o hospital. Na mesma aldeia morreram três irmãos, com os mesmos sintomas. No caso de Pedro Tomichá, na cadeia, a falta de atendimento médico agravou o problema, tornando as feridas crônicas.
Por fim, também foi relatado o caso de duas crianças de Brasnorte, que deveriam ter atendimento neurológico, de fisioterapia constante e fonoaudiologia, passaram os anos de 2017 e 2018 sem qualquer atendimento por negligência do polo de saúde, que justificou não haver carro para o cumprimento da assistência às crianças.
O relatório traz também o número de mortes de crianças indígenas. No total, foram 60. Além disto, foi divulgado o caso de três indígenas da mesma família morreram por causas estranhas em Porto Espiridião. A suspeita da comunidade é que a causa esteja relacionada com o amplo uso de agrotóxicos nas fazendas no entorno da aldeia.
O documento foi elaborado com base em dados da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), secretarias estaduais de saúde, dentre outros órgãos oficiais.
O Cimi é um organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), uma das instituições mais respeitadas do país no tocante à defesa dos direitos humanos.