A decisão judicial determinou que uma família proprietária de uma fazenda em Pontal do Araguaia, Mato Grosso, indenize em aproximadamente R$ 200 mil dois irmãos que foram submetidos a condições análogas à escravidão por mais de duas décadas. A sentença atende a uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho.
A denúncia, recebida em dezembro de 2019 pelo Centro de Referência da Assistência Social (Cras) de Pontal do Araguaia, revelou que os irmãos, com idades de 43 e 49 anos à época, eram encontrados trabalhando “descalços, com as roupas sujas e mau odor”. Suas responsabilidades incluíam serviços gerais, como a manutenção da horta, represa e cuidados com os animais da propriedade. As condições de trabalho e de vida eram tão precárias que, após a primeira visita, os profissionais do Cras retornaram à fazenda com o apoio da Polícia Militar, conduzindo os envolvidos à Delegacia de Polícia Federal para prestar depoimento.
Ambos os irmãos eram vítimas de violência física, incluindo agressões contínuas, uso de pedaços de pau e facão, além de relatos de abuso sexual. A mulher afirmou à equipe do Cras que havia sido forçada a realizar atos indesejados por homens. Um episódio grave de violência ocorreu quando o irmão, motivado pela fome, “furtou” uma galinha e foi agredido, sendo levado a um brejo onde apanhou.
A brutalidade do tratamento causou danos psicológicos significativos, resultando em perda de memória quanto à data de nascimento, idade e nomes de pessoas próximas, conforme destacado pela assistente social Kelly Cristina Pereira.
A proprietária da fazenda e sua filha contradisseram-se várias vezes quanto ao tempo de permanência dos irmãos na propriedade, valores recebidos e posse de documentos pessoais. Elas negaram todas as acusações de maus-tratos e condições degradantes de trabalho, alegando uma relação familiar com os irmãos Santos.
O Ministério Público do Trabalho contestou as alegações, enfatizando que a relação mantida era patronal e não voluntária, associativa, filantrópica, terapêutica ou cooperativa, mantendo a natureza contraprestativa do trabalho rural, mesmo que não formalizada.