Ensino formal à distância para crianças desafia escolas em tempos de pandemia

Surpreendentemente, a medida para salvaguardar o ano letivo acabou impulsionando uma onda de solidariedade contrária à lógica do isolamento social

Fonte: Prefeitura/Neri Malheiros

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Muito além das preocupações e temores típicos de uma pandemia, o vírus que ameaça o planeta Terra tem provocado mudanças de hábitos sociais imagináveis apenas em tramas de filmes de ficção ou somente previstas para as próximas décadas.

Desde o último dia 07, o ensino à distância – modalidade bastante popularizada entre adultos – faz parte da rotina de pouco mais de 8.300 alunos da Pré-escola (Infantis IV e V) e do Ensino Fundamental (do 1º ao 9º anos) da rede pública municipal, que têm recebido por meios virtuais conteúdos lúdicos e pedagógicos repassados diariamente pelos professores. As atividades são encaminhadas online por links enviados nos grupos de WhatsApp criados para cada turma. Tão logo chega o link, o aluno responde suas atividades pelo computador, celular ou tablet.

Ao todo, são 9.140 crianças – 2.475 matriculadas em cinco unidades de educação infantil e 6.665 matriculadas em outras dez unidades de ensino fundamental. No entanto, como 809 delas (8,8%) não dispõem dos recursos tecnológicos necessários em casa, cada escola será responsável pela entrega de atividades impressas durante o período de duração da quarentena.

Embora o uso de tecnologias digitais dentro das salas de aula tenha ganhado cada vez mais espaço na rede municipal de ensino de Lucas do Rio Verde a partir de 2019, antes da confirmação do primeiro caso de coronavírus no país, no dia 26 de fevereiro deste ano, em São Paulo – sequer passava pela cabeça de professores e alunos que, um mês e meio depois, por causa da suspensão das aulas presenciais e do isolamento social obrigatório, que, a princípio, se estenderão até o final do mês, esse seria, para a maioria, praticamente o único meio de interação e de transmissão de conhecimento.

Certamente, isso tudo estava bem mais longe da imaginação daqueles pais e responsáveis que, de uma hora para a outra, além da luta para manter o trabalho diário que garante o sustento da família, passaram a ter que dividir o uso do telefone móvel com os filhos todos os dias e ainda viram aumentada a responsabilidade de acompanhar o desenvolvimento do aprendizado deles, que passou a se dar no interior do próprio lar.

Assim que o primeiro decreto municipal suspendeu as aulas, a rotina de todas as comunidades escolares foi completamente alterada, forçando professores, alunos e pais a se adaptarem aos novos tempos. Com o filho Marco Antônio, de 10 anos e aluno do 5º ano da Escola Caminho para o Futuro, em casa nas últimas três semanas, a mãe, Maryuska Pavão, bem que tentou encontrar um jeito de motivá-lo a estudar longe dos coleguinhas e do ensino formal antes de começarem as aulas online.

“Eu tinha passado algumas coisas para o Marco Antônio e a gente percebia que a atenção era muito menor quando ele estava mexendo apenas com o caderno do que agora com as aulas virtuais. Pelo menos aqui em casa tem dado resultado. Esta semana foi bem mais produtiva. Exatamente por ser de uma geração muito tecnológica, ele fez as atividades com mais rapidez, com mais interesse, com mais vontade. Nós, pais, temos participado mais, estamos mais atentos, cooperando com eles e acompanhando o que eles estão aprendendo. Dessa forma está bem legal porque a gente está estudando juntos, crescendo juntos e aprendendo, principalmente. Quero parabenizar todos os envolvidos e acredito que as próximas atividades serão ainda mais bem elaboradas e atrativas”, observa Maryuska.

Paradoxalmente, a medida criada com o objetivo de dar sequência ao ano letivo tem provocado uma onda de solidariedade enquanto decretos dos governantes se sobrepõem impondo restrições de contato e isolamento social. De certa forma, o projeto, essencialmente virtual, acabou aproximando ainda mais alguns personagens das comunidades escolares. E mesmo sem terem se dado conta, a reinvenção tem feito parte da vida de todos eles ultimamente.

Atualmente na coordenação pedagógica da Escola Caminho para o Futuro, o professor José Marcos de Sousa aproveitou um final de semana para, segundo ele, “mergulhar de cabeça” no Google Forms e no Google Drive, dois aplicativos gratuitos da rede com os quais não tinha familiaridade. Assim que teve domínio sobre as duas novas ferramentas, passou a auxiliar seus colegas com maior dificuldade para lidar com tecnologias digitais.

“Confesso que no dia que nos foi passada a plataforma digital, eu não tinha conhecimento e ficava imaginando o que será isso. E assistindo vídeos, pedindo informação para os professores de tecnologia de informática, consegui aprender e agora estou fazendo um trabalho que eu penso que é de formiguinha: vou na casa do colega, tiro suas dúvidas e deixo ele pronto para trabalhar com o problema. Assim como outros tiveram paciência para me ensinar, agora estou sendo um multiplicador”, relata.

Para uma dessas colegas, a professora Maria Lúcia de Almeida, que dá aula para o 5º ano, a sintonia e a solidariedade entre os membros da equipe de professores têm sido fundamentais para superar os desafios diários e as barreiras provocadas pelo modo de vida e desníveis sociais das famílias. “O professor José Marcos me ajudou a conduzir a aula online quando fui fazer minha primeira atividade. Ele foi me ensinando passo a passo como eu tinha que fazer até enviar o link para os alunos. Recebi vídeos dos alunos para dizer que estavam presentes e prontos para começar a aula e isso não tem preço. Para fazer as atividades, muitos alunos dependem do celular dos pais, que trabalham em diferentes horários, alguns até meia-noite. Então, temos que ter muita paciência, sabedoria e discernimento para lidar com cada situação, inclusive trabalhar com gestão emocional para resolver cada caso da melhor maneira”, defende.

Uma das quatro escolas de ensino em tempo integral da rede do município, a Caminho para o Futuro conta com 42 professores – quatro deles na gestão – para atender 603 estudantes do 1º a 5º ano. De acordo com a gestora Léa Antônia Correa da Silva, apenas 39 crianças (6,5%) ficaram de fora dos grupos de Whatsapp e irão receber suas atividades impressas semanalmente.

“O mais importante disso tudo é que os nossos alunos não ficarão sem aula esse tempo todo e não serão prejudicados em sua aprendizagem e em seu ano letivo. Essa era a nossa maior preocupação. No entanto, a Secretaria Municipal de Educação já estava à procura de uma alternativa online, que já nos foi passada para aprovação, com o passo a passo, e que todos estão apostando que vai dar certo. Aqui na Escola Caminho, já nos organizamos no final de semana e montamos os grupos de Whatsapp. Estão de parabéns todos que se envolveram na criação do regime de aulas virtuais e também os meus professores, que vestiram a camisa, foram atrás e estão muito empolgados em poder trabalhar com essa plataforma”, destaca.

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