O Município de Cuiabá tem até a próxima semana para apresentar em juízo o Regimento Interno da Controladoria Geral do Município (CGM), ou documento equivalente, que indique as atribuições dos cargos do órgão, principalmente, a de Controlador-Geral. A verificação é uma determinação do juiz Bruno D’Oliveira Marques, da Vara Especializada em Ações Coletivas da Comarca de Cuiabá, para que possa tomar uma decisão na ação popular ajuizada pela vereadora Edna Sampaio (PT).
O magistrado já demonstrou na última decisão, do dia 20 de abril, que está atento à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) referente à ocupação do cargo em questão ser feita por servidores da carreira.
Na ação, a vereadora Edna Sampaio pede a adequação da CGM Cuiabá, para que hoje a função exercida por uma advogada, que não é servidora da carreira, possa ser regularizada conforme a Constituição Federal (1988).
A parlamentar sustenta que “os cargos de Controle Interno, nestes incluídos a Chefia do Órgão (Controladora Geral, in casu), não se destinam ao exercício de atividades de direção, chefia e assessoramento, de modo que, assim como não podem ser providos por comissão, também não podem ser exercidos por servidores com função de confiança, já que as tarefas a eles inerentes têm cunho nitidamente técnico, e devem, portanto, ser cumpridas por servidores devidamente capacitados e admitidos por concurso público específico para esse mister, nos exatos termos do inc. II do art. 37 da Carta Magna, sob pena de violação à moralidade administrativa”, diz na petição.
A regra constitucional já foi objeto de ação de Repercussão Geral no STF (RE nº 1.041.210/SP), e o entendimento já pacificado, garantindo a constitucionalização do Controle Interno Municipal, na qual foi firmada a teses de que “a criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais”.
Em Mato Grosso, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1010030-36.2019.8.11.0000), ajuizada pela Associação dos Auditores e Controladores Internos dos Municípios de Mato Grosso (Audicom-MT), reconheceu a inconstitucionalidade que criava o cargo em comissão de Auditor Geral no Município de Rondonópolis (MT).
A decisão, sob relatoria do desembargador Carlos Alberto da Rocha, pontuou que “o desempenho de atividade de natureza técnica/científica próprias de cargos efetivos, que não demandam qualquer relação de confiança com a autoridade nomeante, precipuamente ante o fato de constar a necessidade de “emitir parecer conclusivo sobre as contas anuais prestadas pela administração”.
O juiz Bruno D’Oliveira Marques considerou a jurisprudência pacificada, mas ainda não decidiu sobre os pedidos feitos pela vereadora Edna Sampaio na Ação Popular, porque não há informações nos autos sobre as atribuições do cargo de Controlador-Geral do Município de Cuiabá, “o que é imprescindível com vista a averiguar se ele possui natureza técnica (emissão de parecer, realização de auditorias, fiscalização) ou meramente administrativas (desempenho de funções institucionais relativas à direção da unidade), julgo necessário que o ente requerido traga aos autos o Regimento Interno da Controladoria Geral do Município de Cuiabá”, define.
Na avaliação de Angelo Silva Oliveira, que é ex-presidente da Audicom-MT, a Ação Popular deve ser deferida para fortalecer o sistema de controle interno da Capital. “Do mesmo modo que os auditores e controladores internos não podem ser livremente nomeados, pois, o serviço que prestam, sendo de Estado, não pode estar sob crivo político, de igual modo, o cargo de Controlador-Geral deve seguir a mesma lógica. Estamos diante de uma importante oportunidade do Poder Judiciário garantir a efetiva constitucionalização da CGM Cuiabá”, defende.
Angelo também alerta que a manutenção do provimento “precário”, com livre nomeação e exoneração, para o cargo responsável pelo controle interno “fere de morte” o parágrafo 1º do artigo 74 da Constituição Federal, que afirma: “os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas, sob pena de responsabilidade solidária.
A coordenadora do Observatório Social de Mato Grosso, Elda Valim, avalia que o cargo de Controlador-Geral do Município deve ser ocupado por pessoas de confiança da sociedade e não de confiança de quem ocupa o mandato de chefia do Poder Executivo.
“Temos recente exemplo do município de Cáceres, que depois de ter cargos irregulares no sistema de controle interno declarados inconstitucionais pelo TJMT, (ADI 1014296-32.2020.8.11.0000) passou a cumprir a Constituição chegando a criar mandato para a função de Controlador-Geral do Município, fortalecendo ainda mais a autonomia do órgão para efetivamente fiscalizar as contas públicas”, destaca.
Elda avalia que o gestor “comprometido com o interesse público não tem medo do controle interno forte, pelo contrário, terá esse órgão como parceiro de sua gestão”, pontua.