Uma série de ferramentas nas mãos, dezenas de pneus e muita disposição. Essa é a formula diária que a moradora do bairro Pedra 90 — na periferia de Cuiabá, Miriam Oliveira, de 47 anos, utiliza para transformar o material de borracha em verdadeiras obras-primas. Com o auxílio do esposo, Valdecir Júlio, também de 47 anos, Miriam faz dessa atividade sua única fonte de renda e, ao mesmo tempo, colabora com a cidade em pelo menos dois importantes pontos: a sustentabilidade e o combate ao mosquito Aedes aegypti.
O trabalho com os pneus teve início após a vivência de um drama familiar. Em 2009, a moradora viu seu filho Gabriel Vinícius, na época com nove meses de idade, contrair uma dengue hemorrágica e ficar aproximadamente 11 dias internado no Hospital e Pronto Socorro Municipal de Cuiabá. Com a melhora da criança, ela decidiu que, a fim de evitar que o filho e outras pessoas sofressem com a perigosa doença, precisava fazer um esforço a mais do que já realizava cuidando do seu quintal.
Para fomentar ainda mais esse desejo, Miriam contou com outros dois fatores. O primeiro deles foi a constatação de que, naquele momento, seu bairro encontrava-se entre aqueles que apresentavam os maiores índices de infestação do inseto transmissor de doenças. Cursando a faculdade de Geografia na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), a artesã também precisava desenvolver um projeto para apresentar. Então optou por aliar os dois pontos, a experiência com o filho e dar o pontapé inicial no trabalho.
“Meu filho passou dias internado e sofrendo com a doença. A partir disso eu comecei a pensar em o que poderia fazer para ajudar no combate ao mosquito. Naquele momento, percebi que o pneu estava em evidência nos casos de focos do Aedes. Comecei a recolher aqueles que encontrava descartado nas ruas e trazer para casa. Para que meu quintal não se tornasse um grande criadouro, furei todos eles, empilhei e comecei a colocar a mão na massa. Hoje, eu vejo que meu trabalho tem sido bem aceito. Tanto que, quando um conhecido acha um pneu jogado por aí, recolhe e traz aqui em casa. Outros quando vão trocar o pneu do carro também me doam o usado”, conta.
Parceria com a Prefeitura e ampliação
Autodidata, a cuiabana fundiu as lembranças de quando via, em sua infância, o pai fazendo bacias para lavar roupa, com alguns vídeos da internet e começou a dar aos pneus aspectos diferente dos tradicionais. Um recorte aqui, uma dobra ali e uma amarra acolá. Assim, a dura borracha começou, gradativamente, a se converter em forma de animais, vasos, jogos de cadeiras e os mais variados objetos. Atualmente, as praças construídas ou revitalizas pela Prefeitura de Cuiabá, também possuem a marca de Miriam. Os brinquedos do playground, por exemplo, são fabricados no quintal da artesã.
“Dependendo da peça, conseguimos fazer em aproximadamente meia hora. O corte é um pouco mais demorado, mas passando essa etapa o trabalho, fica mais rápido. Por último pegamos a lixadeira e fazemos o acabamento da peça. Todo o trabalho é realizado aqui na minha área mesmo. Em cima da mesa, no chão, onde tiver um espaço. No entanto, quero construir um barracão com uma área reservada apenas para isso. Para a Prefeitura já fiz os brinquedos dos espaços de lazer no CPA IV, Nova Canaã e Jardim Universitário II”, relata a trabalhadora.
Ciente da importância ambiental e na preservação da saúde dos moradores da comunidade em que reside, Miriam acredita que o trabalho pode se expandir ao longo da cidade. Para isso, ela planeja repassar todo conhecimento que adquiriu com a prática diária. Nesse sentido, conta que já está estudando uma forma de realizar workshops, com objetivo de ensinar outras pessoas a realizar esse trabalho. Segundo ela, a ideia é ministrar um curso com duração de 30 dias e, após o período, criar feiras para que os alunos também consigam vender seus produtos.
“Estou procurando fazer a minha parte e acredito que quanto mais pessoas tiverem essa atitude é melhor para toda a cidade. Por isso, estou pretendendo colocar em prática esse projetinho aqui em casa. Até porque, a Associação de Moradores tem como meta desenvolver ações de geração de emprego e renda. Então poderíamos montar uma feira para vender esses produtos e ajudar outras famílias da região. Já estou em conversa com a Prefeitura também para ampliar a distribuição das peças para as escolas municipais”, pontua Miriam.