Impactados pela pandemia do novo coronavírus (covid-19), os times que integraram a Série A do Campeonato Brasileiro na última temporada tiveram queda de 9,1% nas receitas entre 2019 e 2020. É o que mostra o estudo anual da consultoria financeira BDO sobre as finanças dos clubes de futebol do país. O levantamento é feito desde 2010. Em entrevista à Agência Brasil, o analista Carlos Aragaki, da BDO, avaliou que as perdas podem ser recuperadas “no curto e médio prazo”, com o advento das vacinas e a reabertura dos estádios, prevista por ele para 2022.
O especialista destacou que a pandemia ainda afetará o mercado de transferências, que tem peso cada vez mais significativo no orçamento dos clubes. Segundo o estudo, as negociações de atletas equivaliam a 14% da fonte de receita média das equipes da Série A nacional em 2016. No ano passado, elas já representavam 29%.
“No que diz respeito às receitas, neste ‘novo normal’, elas podem ser retomadas no curto e médio prazo. A partir do momento em que a população estiver vacinada, a torcida retorna ao estádio e voltam as receitas de bilheteria. Agora, sobre negociação de atletas, acho que temos de esperar um pouco. Os grandes investidores [do futebol] no momento são mecenas, chineses ou árabes. Eles também sentiram impacto nos negócios [com a pandemia], não só no futebol”, argumentou Aragaki.
“A Europa freou as negociações, não em quantidade, mas em valores pagos. Por um tempo, não se conseguirá ter o mesmo ganho em negociações – acredito fortemente nisso – que se tinha no passado. Pode ser que o Brasil continue exportando muito, mas não nos valores de antes. [A receita de transferências] Será ainda uma significativa, mas isso vai pesar”, completou.
Conforme Aragaki, a pandemia impactou de maneira mais significativa três formas de receita: bilheteria, patrocínios e programas de sócios-torcedores.
“É tudo aquilo que envolve, vamos dizer assim, o público. A bilheteria foi fortemente afetada [pela impossibilidade dos torcedores irem ao estádio]. Clubes como Flamengo, Corinthians e Palmeiras vinham de bilheterias muito fortes, com média [de arrecadação] de R$ 60 milhões/ano. Transformando em números, a bilheteria deles seria praticamente a receita total de Coritiba, Fortaleza, Ceará, Atlético-GO e Goiás”, descreveu o analista.
“Muitos clubes perderam patrocínio. Em alguns casos, pacotes de pay-per-view foram cancelados. Ainda que, por exemplo, na pandemia, o Campeonato Paulista tenha sido retomado após dois meses parado, muita gente cancelou os pacotes e demorou a voltar e alguns sequer voltaram. O torcedor, muitas vezes, quer o [programa de] sócio-torcedor para ir ao jogo e ter privilégio na compra dos ingressos. Ainda não é a massa no Brasil que vira sócio-torcedor para visitar o clube ou trocar a camisa”, emendou.
“Diria que [a pandemia] impactou 80% dos clubes da Série A. É uma preocupação das gestões para 2021, pois temos a percepção que esse aspecto negativo continuará. Os aumentos de receita foram questões pontuais. Se você as desconsidera, diria que 100% dos clubes perderam receita na fonte”, afirmou Aragaki.
Santos (40%), Internacional (36%), Fortaleza (34%), Bahia (31%) e Flamengo (30%) foram os cinco clubes com maior variação negativa de receitas entre 2019 e 2020. Na outra ponta, Ceará (1%), Grêmio (6%), Goiás (9%) e São Paulo (10%) são os que tiveram menor queda.
O estudo também analisou as receitas recorrentes – que não levam em conta arrecadações consideradas “extraordinárias”, como negociação de jogadores ou premiações. Neste recorte, o Corinthians passou a ter variação negativa (24%) e o Goiás foi a equipe mais impactada entre um ano e outro, com redução de 56%, seguido por Athletico-PR, Fortaleza (ambos 42%), Flamengo (31%) e Ceará (29%). Destes cinco, Furacão e Vozão conseguiram fechar 2020 no azul.
“A conta básica é: para fechar no azul, você tem que ter mais receita do que custo. É possível, mesmo não sendo top dez de torcida ou exposição de mídia na Série A, fazer uma gestão proativa e razoável. Por outro lado, há clubes que fecharam o ano com déficit. A saída para estes é: se não consigo aumentar a receita, terei que trabalhar para, pelo menos, reduzir custos e dívidas, porque se você tem um passivo menor, tem menos variação monetária para pagar”, concluiu Aragaki.