O uso de inteligência artificial nas Eleições Municipais de 2024 será regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As regras para a utilização das tecnologias digitais estão previstas na minuta de resolução que trata da propaganda eleitoral.
O texto ainda será debatido em audiência pública no dia 25 de janeiro, com a participação da sociedade, de instituições públicas, organizações privadas, partidos políticos e comunidade acadêmica, entre outros, e, posteriormente, aprovado em Plenário. Qualquer pessoa maior de 18 anos pode se inscrever para participar e contribuir com o debate sobre as normas que regerão o pleito municipal.
Essa e as demais instruções são relatadas pela vice-presidente da Corte Eleitoral, ministra Cármen Lúcia, que estará à frente do Tribunal durante as eleições, em outubro deste ano.
Uso de tecnologias para fabricar ou manipular conteúdos deverá ser informado
Entre as novidades estão a inclusão do artigo 9º-B, que traz a obrigatoriedade de informar explicitamente a utilização de conteúdo fabricado ou manipulado em qualquer modalidade de propaganda eleitoral. É considerada manipulação a criação ou a edição de conteúdo sintético que ultrapasse ajustes destinados à melhoria da qualidade do material.
Estão incluídos nestas categorias imagens ou sons criados, substituídos, omitidos, mesclados, sobrepostos ou que tenham tido a velocidade alterada por meio de ferramentas tecnológicas, como a inteligência artificial. A minuta também prevê a necessidade de comunicar qual a tecnologia utilizada para conceber ou modificar o conteúdo.
Descumprimento poderá acarretar detenção ou pagamento de multa
Em caso de descumprimento, poderá ser aplicada a sanção prevista no §1º do artigo 323 do Código Eleitoral (Lei nº 4.737/65), que estabelece pena de detenção de dois meses a um ano ou pagamento de 120 a 150 dias-multa para quem produz, oferece ou vende vídeo com conteúdo inverídico acerca de partidos ou candidatos.
O artigo proíbe a veiculação de conteúdo fabricado ou manipulado de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados com potencial de desequilibrar o pleito ou a integridade do processo eleitoral, inclusive na forma de impulsionamento. Quando notificado sobre a ilicitude, o provedor de aplicação de internet adotará providências para a devida apuração do caso e indisponibilização do material impulsionado.
Também é de responsabilidade do provedor a adoção de medidas para impedir ou reduzir a circulação de conteúdo ilícito que atinja a integridade do processo eleitoral, incluindo a garantia de mecanismos eficazes de notificação, acesso a canal de denúncias e ações corretivas e preventivas (art. 9º-C).
Agências de verificação conveniadas ao TSE têm autonomia para classificar conteúdos
Além disso, o parágrafo único ainda reforça a autonomia das agências de verificação de fatos que firmarem termo de cooperação com o TSE. A classificação dos conteúdos – como falsos, verdadeiros, enganosos ou descontextualizados, por exemplo – será feita de forma independente e sob responsabilidade dessas instituições especializadas.
Ao usar, na propaganda eleitoral, qualquer modalidade de conteúdo, incluindo os produzidos por outras pessoas, candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações devem verificar se a informação veiculada é minimamente confiável. Caso contrário, as pessoas responsáveis estão sujeitas a uma possível concessão, à parte ofendida, do direito de resposta, nos termos do art. 58 da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/97), sem prejuízo de eventual responsabilização na esfera penal.
Embora essa determinação estivesse prevista no artigo 9º da resolução que trata da propaganda eleitoral desde 2021, a minuta que será discutida em audiência pública no final deste mês trouxe uma inovação: a partir das Eleições 2024, a classificação do material reproduzido na propaganda pela agência de checagem poderá ser usada como parâmetro para aferir uma eventual violação ao dever de cuidado que já havia sido estabelecido pelo normativo.
Conforme o § 1º do artigo 8º, no caso de a propaganda eleitoral na internet veicular desinformação sobre o processo eleitoral, juízas e juízes eleitorais ficarão vinculados às decisões do Tribunal Superior Eleitoral que tratarem do mesmo tema e objeto quanto à remoção ou à manutenção de conteúdos idênticos.
Propaganda negativa, priorização paga e comercialização de conteúdos inverídicos
De acordo com a instrução, o impulsionamento de conteúdo político-eleitoral será autorizado durante a pré-campanha desde que sejam observadas a moderação e a transparência dos gastos com o serviço. O pedido explícito de votos, contudo, está proibido na fase de pré-candidatura (art 3º-B).
A propaganda negativa é vedada tanto no impulsionamento quanto na priorização paga de conteúdos em aplicações de busca. No §7-B do artigo 28, o texto veta o uso, como palavra-chave, do nome de partido, federação, coligação ou candidatura adversária, mesmo que a finalidade seja promover propaganda positiva da parte responsável pelo impulsionamento.
Também não é permitido difundir dados falsos, notícias fraudulentas ou informações gravemente descontextualizadas, ainda que benéficas à autora ou autor da publicação. Eventuais condutas que violem essas regras poderão ser objeto de ação que apure a prática de abuso de poder.
Outra vedação, prevista no §12 do artigo 29, diz respeito à comercialização, por provedor de aplicação de internet, de qualquer modalidade de impulsionamento de conteúdo que veicule fato sabidamente inverídico ou gravemente descontextualizado que atinja a integridade eleitoral.
Lives eleitorais, tratamento de dados sensíveis e revogação de dispositivos
A live eleitoral – entendida como transmissão digital realizada por candidata ou candidato para promover sua candidatura com ou sem participação de terceiros – constitui ato de campanha eleitoral de caráter público (art. 29-A). Aplicam-se às lives as mesmas regras referentes à propaganda eleitoral na internet, incluindo a proibição quanto à transmissão ou retransmissão em sites de pessoas jurídicas.
A minuta define normas mais rigorosas para o tratamento de dados sensíveis. É vedado, por exemplo, o uso dessas informações para criar perfis de usuárias e usuários com a intenção de direcionar, de modo segmentado, propaganda eleitoral sem o consentimento específico e destacado do titular (art. 33-B).
Entre as atribuições dos provedores de aplicações estão garantir o respeito aos direitos e acesso facilitado às informações sobre o tratamento de dados dispostos na Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018), além de adotar medidas para a proteção contra a discriminação ilícita e abusiva.
A proposta ainda revogou o Capítulo IX, que trata das condutas vedadas a agentes públicos em campanha eleitoral, e os artigos 109, 123 e 124 do Capítulo XI – Disposições finais.
Inscrições para as audiências públicas
Para participar da audiência pública, as pessoas interessadas devem enviar propostas por meio do formulário eletrônico disponibilizado no Portal do TSE até as 23h59 de 19 de janeiro. No mesmo formulário, também é possível se inscrever para fazer uso da palavra no evento. A lista de inscrições deferidas será divulgada no Portal do TSE em 22 de janeiro.
Podem participar pessoas e instituições públicas e privadas (incluídos os partidos políticos), os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e as associações profissionais e acadêmicas interessadas em apresentar sugestões nas Resoluções que serão aplicadas às Eleições Municipais de 2024.
As audiências públicas serão conduzidas pela vice-presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, relatora de todas as instruções das eleições 2024, e realizadas nos próximos dias 23, 24 e 25 de janeiro, sempre a partir das 9h, no Auditório I da sede do TSE, em Brasília. O evento também será transmitido ao vivo no canal do Tribunal na plataforma YouTube.