Uma sociedade inclusiva, sem preconceito e mais incentivo a capacitação profissional para ampliar as oportunidades de emprego foram algumas das reivindicações apresentadas pelos participantes da sessão solene em comemoração ao Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, nesta sexta-feira (15).
A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é tetraplégica, disse que se sente um instrumento para lutar, no Congresso Nacional, a favor dos direitos das pessoas com deficiência. Ela ressaltou a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI), sancionada em 2015, como um marco para se avançar na busca da igualdade e respeito, mas apontou tentativas de promover retrocessos na legislação. Ela criticou a aprovação do projeto que altera a Lei de Improbidade Administrativa para retirar do agente público o dever de promover a acessibilidade prevista na LBI.
— Isso entristece demais, mas é neste momento que a gente tem que elevar a voz e dizer que a gente não vai permitir mais nenhum retrocesso a uma sociedade que não pregue capacitismo, mas, sim, inclusão a todas as crianças com deficiência na rede regular de ensino, com jovens com deficiência tendo a oportunidade de fazer um curso técnico, de fazer uma faculdade, de estagiar, de trabalhar, de transformar a comunidade. Queremos as pessoas com deficiência circulando pelas calçadas das cidades e podendo atuar em todos os campos: na ciência, na educação, no Judiciário, no esporte, nas artes, na política. A gente quer conviver, quer participar.
Mercado de trabalho
Já o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), requerente da sessão, lembrou que a data é celebrada no dia 21 de setembro e foi criada por iniciativa do Movimento pelos Direitos das Pessoas Deficientes. De acordo com ele, o Brasil registra hoje 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência, sendo necessário um olhar especial para as políticas públicas de inclusão, especialmente àquelas voltadas a melhorar o acesso dessas pessoas ao mercado de trabalho.
— Quando falamos em acesso ao mercado de trabalho para a pessoa com deficiência, a capacitação é essencial. Apesar de termos, há 30 anos, uma lei que garante vagas de emprego para pessoas com deficiência, as empresas não a cumprem, alegando que falta capacitação. De forma geral, a cota de emprego só é oferecida para serviços gerais, pelos quais as empresas pagam pouco, sem dar oportunidade para aqueles que têm formação. Além disso, a fiscalização do cumprimento da Lei de Cotas ainda não é efetiva.
Investir na acessibilidade e na capacitação profissional também foi a defesa da empresária e ativista social Samanta Bullock. Ela trabalha com moda inclusiva em Londres, e mencionou os avanços da Inglaterra como inspiração para que um dia, no Brasil, as pessoas com deficiência não precisem recorrer à Lei de Cotas para terem inserção no mercado de trabalho.
— Aqui a lei maior é a da igualdade. Então, nós não temos outras leis e não temos a lei de cota. A minha mensagem, principalmente, é esta: que a gente possa trabalhar na acessibilidade junto, em paralelo com a capacitação da pessoa com deficiência, para que no futuro a gente não precise mais desses favores e que, sim, a pessoa com deficiência possa ser contratada pelos seus atributos, pela sua capacidade em vez de ser contratada pela sua condição. Eu sei que é um longo processo.
As dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência foram exemplificadas pelo presidente da Associação Lelê de Agenesia de Membros, Ricardo Fabris Paulin. Para ele, é preciso investir numa educação inclusiva com mudanças de propósito das pessoas e conscientização.
— Uma estudante de Odontologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, que tenta ser dentista. Ela quer ser dentista, mas ela tem agenesia de membros. Olhem a dificuldade em relação a isto: uma dentista que não tem um braço. E nós trabalhamos diariamente para essa estudante ser o quê? Incluída, ela ter condições de realizar o sonho dela. Isso é apenas um dos exemplos. E o tão difícil é em relação ao preconceito, não o preconceito só dos colegas, o preconceito dos professores dentro de uma instituição pública.
O mesmo alerta foi feito por Iury Moraes Eminergidio, professor de Português. Ele, que tem deficiência visual e auditiva, ressaltou a importância de garantir condições para que esses estudantes tenham autonomia, especialmente no ensino superior.
— Para a inclusão e para todo esse processo universitário, a acessibilidade é importante. Eu tive o apoio do Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais da Universidade de Brasília (PPNE), onde eu estudei, e em vários locais nós precisamos ampliar todo esse processo, esses setores de apoio à pessoa com deficiência. Em vários outros lugares nós precisamos fazer esse processo acontecer.
Já a campeã mundial de vela paralímpica Ana Paula Marques disse que encontrou no esporte a força para seguir lutando por mais inclusão. Ela, que perdeu os movimentos dos membros inferiores após levar um tiro do ex-marido, disse que só passou a perceber as limitações impostas no dia a dia quando ficou sem os movimentos das pernas.
— Para mim, o esporte me salvou, me deu mais forças para continuar essa luta, porque antes, aos 20 anos, eu não tinha deficiência nenhuma e não via dificuldade nenhuma de locomoção. Quando eu me tornei pessoa com deficiência, eu vi essa dificuldade e vi que a minha vida seria difícil a partir dali. E foi realmente. Foram muitos obstáculos até chegar aqui. E o esporte me salvou, me trouxe grandes benefícios e força para continuar e não desistir.
Ensino especializado
O membro da diretoria da Associação Brasiliense de Deficientes Visuais (ABDV), César Achkar Magalhães destacou a importância da educação especializada. Na sua avaliação, para que seja conquistada autonomia, é preciso pensar na educação das pessoas com deficiência, que muitas vezes precisarão de uma atenção distinta.
— A educação hoje está sendo discutida em tribunais, não no meio dos educadores e dos educandos, como vinha sendo até então. Infelizmente, hoje, há uma discussão no Supremo Tribunal Federal que coloca inclusive em risco a existência dos centros de ensino e isso me preocupa muito. Eu sou ex-aluno de um centro de ensino e eu sei a diferença que fez na minha vida passar por essa instituição.
Observações semelhantes foram feitas pelo diretor-presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil, Fernando Cotta, e pela presidente da Federação das Associações de Doenças Raras das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, Mônica Maria Vieira Alderaldo. Eles também pediram mais apoio dos governos federal e estadual na promoção do acesso as assistências social e de saúde.
— Apenas 5% dos nossos tratamentos, hoje, são disponibilizados pelo SUS e, mesmo esses 5%, às vezes, não chegam à ponta. Mesmo estes estando dentro do SUS, nós hoje temos uma falta de entrega desses tratamentos; nós estamos com várias pessoas sem tratamentos — relatou Mônica Alderaldo.
Ainda participaram da sessão o coordenadora-geral do Centro Educacional da Audição e Linguagem Ludovico Pavoni (CEAL), Maria Inês Correia Serra Vieira; a proprietária e responsável técnica do Laboratório de Genética Neurogene, Ingrid Tremel Barbato; a secretária municipal da Pessoa com Deficiência na Cidade do Rio de Janeiro, Helena Werneck; e a diretora estratégica da Associação Lelê de Agenesia de Membros, Mara Lúcia Bonfim. Também estiveram na sessão a diretora administrativa da Associação Lelê de Agenesia de Membros, Liana Bonfim Misson Paulin, o diretor de marketing da Associação Lelê de Agenesia de Membros, Wallas Nunes Borges e a mãe de Iury Moraes Eminergidio, Elemregina Moraes Eminergido.