Famílias de vítimas da ditadura militar receberam, em Brasília, certidões de óbito retificadas, documentos que reconhecem oficialmente a responsabilidade do Estado pelas mortes ocorridas no período. A entrega foi realizada no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania durante o II Encontro Nacional de Familiares de Pessoas Mortas e Desaparecidas Políticas.
Entre os homenageados, a ex-lavradora Maria de Fátima Marinelli recebeu o documento do marido, Nativo da Natividade de Oliveira, morto em 1985. A nova certidão registra a causa como “morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro”, encerrando uma espera marcada por dor e silêncio. Oliveira atuava na organização de trabalhadores em Carmo do Rio Verde (GO) e era alvo frequente de ameaças.
Segundo a investigação citada pela Comissão Nacional da Verdade, o assassinato foi cometido por um pistoleiro, supostamente a mando do então prefeito da cidade. A família relata que, após a morte, enfrentou dificuldades financeiras e perseguições, enquanto os filhos ainda crianças precisaram ajudar na roça.
Além de Maria de Fátima, outras 27 famílias receberam certidões retificadas. A ministra Macaé Evaristo afirmou que a preservação da memória e o reconhecimento das violações devem ser compromisso permanente do país, e não apenas dos governos.
Números oficiais apontam ao menos 434 mortos em decorrência da repressão. Certidões já foram entregues em outros estados, e novas emissões estão previstas para o próximo ano, segundo a Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos.
No evento, familiares revisitaram histórias marcadas pela violência do período. A advogada Andréia Pereira relembrou o desaparecimento do tio, Demerval da Silva Pereira, morto no Araguaia em 1974. Já a enfermeira Sueli Damasceno emocionou-se diante da foto do irmão, Jorge Aprígio de Paula, baleado pelas costas durante protesto no centro do Rio em 1968. Ela destacou que o novo documento corrige distorções históricas e dá dignidade à memória do irmão, então estudante e operário.
A Comissão aponta que o processo de reconhecimento das vítimas avança desde 1995, com a lei que oficializou mortes antes tratadas como desaparecimentos. Para os familiares, as certidões são mais que registros burocráticos: representam uma reparação simbólica e um alerta permanente sobre os impactos da repressão no país.



















