A presente análise visa discutir a inviabilidade de servidores comissionados ocuparem cargos de auditores ou controladores, ou denominação equivalente, assim como os cargos de chefia nos órgãos centrais de controle interno. A problemática reside na acumulação de funções técnicas, burocráticas e permanentes, previstas em normas dos tribunais de contas, leis federais e especialmente na Constituição Federal (CF).
A CF, em seu art. 74, estabelece que os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão um sistema de controle interno integrado com a finalidade de apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional, conforme o inciso IV. O § 1º do mesmo artigo ressalta a responsabilidade solidária dos responsáveis pelo controle interno ao tomarem conhecimento de irregularidades ou ilegalidades.
Já o inciso V do art. 37 da CF indica que os cargos em comissão destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento.
Para elucidar ainda mais a problemática, é importante exemplificar a situação. Suponha que um funcionário comissionado seja nomeado como auditor interno responsável por investigar possíveis irregularidades e práticas ilícitas no setor financeiro de determinado órgão público. Nesse contexto, o auditor, que deveria ser um servidor concursado com conhecimentos técnicos específicos, acaba sendo substituído por alguém sem a devida qualificação e cuja nomeação pode ter sido decorrente de uma relação pessoal ou política, e não por mérito ou competência técnica.
Essa substituição pode gerar graves consequências para a qualidade do controle interno do órgão público, comprometendo a imparcialidade, a eficácia e a efetividade das auditorias e verificações, uma vez que o auditor comissionado pode ser influenciado por fatores externos, tais como interesses políticos e pessoais. A nomeação de comissionados para cargos de natureza técnica, neste caso, não apenas desvirtua o exercício das funções, como também pode gerar suspeitas sobre a real capacidade dessa nomeação assegurar a transparência e fiscalizar adequadamente o órgão.
Decisões jurisprudenciais
O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) decidiu na ADI de Rondonópolis, em que a Associação dos Auditores e Controladores Internos de Mato Grosso (Audicom-MT) contestava a criação de cargos comissionados para auditor geral, auditor público e gerente de núcleo da Unidade Central de Controle Interno do Município. A ação foi julgada procedente, reforçando a inconstitucionalidade da criação desses cargos. A decisão unânime, liderada pelo relator da ADI, Desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha, foi acompanhada por todos os demais desembargadores do Órgão Especial do TJMT, julgando a ação como procedente e reforçando a inconstitucionalidade da criação desses cargos. É importante destacar que essa decisão já transitou em julgado.
Pela análise da CF e das decisões jurisprudenciais, conclui-se que a ocupação de cargos de auditores e controladores, bem como os cargos de chefia, por servidores comissionados é incompatível com as atribuições técnicas, burocráticas e permanentes previstas nas normativas aplicáveis.
As funções de direção, chefia e assessoramento, destinadas aos cargos em comissão, são distintas das atribuições dos cargos em questão, cuja atuação é essencial para garantir a eficiência e a legalidade no controle interno. Assim, a designação de servidores comissionados para o exercício dessas funções pode resultar na fragilização do sistema e na inconstitucionalidade dos respectivos cargos.
Angelo Silva de Oliveira é controlador interno da Prefeitura de Rondonópolis/MT (Licenciado), presidente de honra da Associação dos Auditores e Controladores Internos dos Municípios de Mato Grosso (AUDICOM-MT), mestre em Administração Pública (UFMS), especialista em Gestão Pública Municipal (UNEMAT) e em Organização Socioeconômica (UFMT), graduado em Administração (UFMT) e auditor interno NBR ISO 9001:2015 (GITE).