A redução crescente de polinizadores silvestres no mundo já impacta diretamente culturas dependentes da polinização cruzada, como frutas e nozes. A macadâmia — árvore subtropical, originária da Austrália, e cultivo para produção de nozes — é uma cultura dependente da polinização por abelhas, com algumas cultivares comerciais altamente dependentes da polinização cruzada.
Uma pesquisa, que envolveu a Austrália, o Brasil e a África do Sul, teve como objetivo determinar o nível de polinização cruzada na produção e seus efeitos na qualidade das nozes, em 19 cultivares comerciais. Mais de 1.300 frutos, obtidos em 23 pomares, foram analisados geneticamente determinando-se a origem paterna de cada noz e o efeito do pólen na qualidade de frutos autopolinizados e resultantes da polinização cruzada.
Os resultados foram claros: em 17 dos 23 locais avaliados, entre 80% e 100% das nozes foram resultantes de polinização cruzada, mesmo no centro dos blocos de cultivo, onde a tendência seria maior para a autopolinização. Segundo os autores, esses resultados mostram que a polinização cruzada é o sistema de reprodução predominante em uma ampla gama de cultivares internacionais de macadâmia, ou seja, suas flores dependem da polinização cruzada para produzir frutos para a colheita.
Justamente por isso, a produtividade da macadâmia pode ser menor no centro de blocos de cultivares únicos do que nas bordas dos blocos, onde as árvores estão mais próximas das flores de outras cultivares. Portanto, a produtividade dos pomares comerciais de macadâmia pode ser limitada por uma combinação de fatores: alta dependência da polinização cruzada, longas distâncias até uma fonte de pólen cruzado e dispersão limitada do pólen cruzado pelos polinizadores.
Outro resultado importante destacado na publicação é que a polinização cruzada também afetou atributos de qualidade. As nozes resultantes desse processo são amêndoas maiores do que aquelas formadas por autopolinização. Também obtiveram rendimento superior — entre 3,3% e 6,4% — e maior concentração de óleo, chegando a 3,5% a mais. Na prática, essa diferença representa um ganho de valor entre US$ 433 e US$ 841 por tonelada, considerando o preço médio internacional de US$ 3 mil por tonelada de noz com casca.
Essa melhoria, em atributos de qualidade, está relacionada às aparências conhecidas como xenia, em que características da semente e do fruto são influenciadas não apenas pela planta-mãe, mas também pelo doador de pólen. O mesmo efeito já foi observado em outras culturas como amêndoas e avelãs.
A dependência da macadâmia pela polinização tem implicações diretas no manejo. Por ser cultivado majoritariamente em pomares clonais — grandes blocos com fileiras contínuas de uma única cultivar — as oportunidades de troca de pólen entre cultivares são menores no centro dos plantios.
O estudo mostrou que as abelhas transportam pólen entre as cultivares, confirmando que o posicionamento das cultivares no pomar, a abundância entre blocos variados e a distribuição estratégica de colmeias são fatores essenciais para alcançar uma produtividade elevada. As cultivares de macadâmia apresentam florada massiva durante um período relativamente curto de abundância, de algumas semanas, produzindo de 100.000 a 400.000 flores por árvore.
Portanto, o estabelecimento de pomares de macadâmia com blocos que compreendem várias fileiras de uma única cultivar, pode reduzir as chances de as abelhas viajarem entre cultivares e depositarem pólen “cruzado” nas flores. O planejamento de várias fileiras de cada cultivar reduz o custo de algumas operações de manejo do pomar, mas também pode levar à redução da produção devido a uma polinização cruzada inconveniente.
No Brasil, a cultivar IAC 4-12B apresentou 88% de frutos resultantes de polinização cruzada e na África do Sul, a cultivar A4 apresentou comportamento semelhante ao observado na Austrália, com altos índices de cruzamentos. Algumas cultivares, entretanto, apresentaram maior proporção de frutos autopolinizados, como a ‘814’, com apenas 10% de cruzamentos no local analisado.
O estudo também inclui quais plantas atuaram como principais doadoras de pólen. Na maioria dos casos, as cultivares plantadas mais próximas foram responsáveis pela fertilização cruzada. Em situações mais complexas, com pomares que reuniam várias cultivares próximas entre si, também houve contribuição de cultivares localizadas até 500 metros de distância.
Para os pesquisadores, os dados reforçam a necessidade de redesenhar os pomares de macadâmia, uma vez que essa cultura depende fortemente da polinização cruzada para formar frutos maduros com qualidade superior. O trabalho foi premiado pela Southern African Society for Horticultural Sciences, que concedeu o prêmio de melhor artigo publicado em um periódico científico revisado por pares na área de horticultura, durante o congresso conjunto realizado em Polokwane, de 18 a 23 de janeiro de 2025.
Sobre a premiação recebida pelo artigo, a pesquisadora Kátia Braga acrescentou que outro aspecto importante também deve ser considerado no redesenho dos pomares comerciais de macadâmia: a necessidade de se dispor de uma diversidade de abelhas silvestres. “Estudos científicos revelaram que, em diversas culturas agrícolas, a polinização realizada por uma diversidade de insetos silvestres não é elevada pela espécie de abelha manejada com essa especificamente, sendo apenas complementada”, diz ela.
Portanto, ao pensar no desenho dos pomares com cultivares de macadâmia, um pesquisador recomenda que se considere talhões menores e diversificados, entremeados por habitats nativos para garantir uma abundância de diferentes espécies de abelhas, mesmo quando se maneja uma ou mais espécies para a polinização.
Ela ressaltou também que a publicação do artigo é um resultado decorrente de projeto de pesquisa desenvolvido pela Embrapa Meio Ambiente e pela Queen Nut Indústria e Comércio de Alimentos Ltda. , intitulada “Levantamento da entomofauna associada presente e identificação de insetos-pragas exóticas ausentes com potencial de dano ao cultivo de macadâmia em Dois Córregos, SP” , realizado no período de outubro de 2019 a setembro de 2024.
O estudo de Stephen Trueman, Universidade Griffith, Austrália; Marco Penter, Conselho de Pesquisa Agrícola/Culturas Tropicais e Subtropicais, África do Sul; Katia Braga, Embrapa Meio Ambiente; Joel Nichols, Universidade Griffith; Anushika da Silva, Universidade Griffith; Adalgisa Thayne Ramos, Embrapa Meio Ambiente; Leonardo Moriya, Rainha Noz Macadâmia; Steven Ogbourne, Universidade da Sunshine Coast, Austrália; David Hawkes, Universidade de Queensland, Austrália; Trent Peters, Universidade de Queensland; Naga Kasinadhuni, Universidade de Queensland; Shahla Hosseini Bai, Universidade de Queensland; Helen M. Wallace, Universidade de Tecnologia de Queensland e; Wiebke Kämper, Universidade de Göttingen, Alemanha, pode ser acessado no site da Embrapa.


















