A Justiça Federal em Pernambuco determinou que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) desocupe uma fazenda pertencente à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), localizada em Petrolina (PE).
Em sua decisão, desta quarta-feira (19), a juíza federal Danielli Farias Rabelo Leitão Rodrigues estabelece que os cerca de 600 integrantes do movimento que estão na propriedade desde a madrugada do último domingo (16) deixem a área em até 48 horas após serem notificados, o que aconteceu na manhã de hoje (20).
A juíza também estabeleceu uma multa diária de R$ 500 a ser aplicada contra o MST caso seus integrantes não deixem o local voluntária e pacificamente dentro do prazo.
Por telefone, o chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Semiárido, unidade da empresa pública responsável pelo terreno de cerca de 500 hectares, Anderson Ramos de Oliveira, disse aguardar o cumprimento da sentença.
Na terça-feira (18), Oliveira concedeu entrevista à Agência Brasil, garantindo que a propriedade é usada há décadas para a realização de experimentos que buscam tornar mais resistentes as sementes e mudas de plantas cultivadas no Cerrado, aumentando a produtividade destes produtos. Além disso, parte do terreno é mantida intocado de forma a preservar a flora nativa.
Acordo
Segundo um dos dirigentes do MST em Pernambuco, Paulo Sérgio, a decisão da Justiça Federal foi anunciada após o movimento firmar um acordo com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA). De acordo com Sérgio, representantes do movimento se reuniram com representantes da pasta nesta quarta-feira, em Brasília, e aceitaram deixar a área mediante o compromisso do governo federal de assentar cerca de 800 famílias sem terra de Pernambuco.
“Após a negociação, chegamos a um acordo com o MDA que consideramos uma conquista. Nos comprometemos a deixar a área voluntariamente. Em contrapartida, a partir da próxima semana, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária [Incra] enviará equipes para começar a cadastrar a 800 famílias que serão posteriormente assentadas em cinco áreas que o movimento indicará para que sejam destinadas à reforma agrária”, afirmou Sérgio, explicando que o acordo prevê que as cinco propriedades fiquem em Petrolina (três) e Lagoa Grande (duas).
“Já temos três destas áreas identificadas. Pretendemos identificar mais duas. Nossa meta é assentar 800 famílias: as 600 que estão participando da ocupação [da fazenda da Embrapa] e outras 200 que estão acampadas na região. Além disso, acordamos que, até que estas famílias estejam assentadas e possam começar a receber apoio técnico e financeiro, o governo federal fornecerá cestas básicas”, acrescentou o dirigente sem terra, ponderando que, embora o movimento já tenha começado a mobilizar as famílias para deixar a área da Embrapa, há o risco de que nem todas consigam deixar a propriedade até sábado. “Ainda vamos verificar com os advogados do movimento esta questão do prazo judicial, mas vamos honrar o acordo, deixar a área e permanecer vigilantes até que o governo cumpra sua parte.”
A Agência Brasil entrou em contato com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar para que a pasta comente o acordo e aguarda retorno.
Ministério da Agricultura
Na terça-feira, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, usou sua conta pessoal no Twitter para criticar a ação do MST. Fávaro, que é ligado à agropecuária e foi vice-governador de Mato Grosso, classificou a iniciativa de “invasão” e disse que é “inaceitável”.
“Sempre defendi que o trabalhador vocacionado tenha direito à terra. Mas à terra que lhe é de direito! A Embrapa, prestes a completar 50 anos, é um dos maiores patrimônios do nosso país. O agro produz com sustentabilidade; se apoia nas pesquisas e em todo o trabalho de desenvolvimento promovido pela Embrapa. Atentar contra isso está muito longe de ser ocupação, luta ou manifestação. Atentar contra a ciência, contra a produção sustentável é crime e crime próprio de negacionistas”, escreveu Fávaro.
Jornada
A ocupação da fazenda da Embrapa Semiárido por integrantes do MST não foi um ato isolado. Segundo o movimento, a ação faz parte da 26ª Jornada Nacional de Luta pela Terra e pela Reforma Agrária, que ocorre em todo o país, com “mobilizações massivas” em ao menos 18 estados.
Só em Pernambuco, o MST afirma que, até ontem, já tinha ocupado nove propriedades desde o último dia 3. Sete destas ocupações ocorreram no último fim de semana, nas cidades de Timbaúba, Jaboatão dos Guararapes, Tacaimbó, Caruaru, Glória do Goitá, Goiana, além de Petrolina.
Além de propriedades rurais e terras públicas, os sem-terra também ocuparam ou protestaram diante de escritórios do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em ao menos 12 unidades federativas (Maranhão, Rio Grande do Norte, Ceará, Sergipe, Paraíba, Mato Grosso, Santa Catarina, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Distrito Federal).
De acordo com o MST, as ocupações, marchas, vigílias, acampamentos e demais ações em defesa da reforma agrária continuarão acontecendo de forma coordenada até ao menos a próxima quinta-feira (20). Além de criticar a concentração de terras brasileiras na mão de poucas pessoas e empresas, a jornada resgata, anualmente, a memória dos 21 trabalhadores rurais sem-terra assassinados por policiais militares, em 17 de abril de 1996, em Eldorado dos Carajás (PA), no episódio que ficou conhecido como Massacre de Eldorado dos Carajás.
Edição: Juliana Andrade