Aos 80 anos, Adelia Sampaio revisita uma trajetória marcada por rupturas e descobertas que redefiniram seu lugar no audiovisual brasileiro. Em 1984, tornou-se a primeira mulher negra a dirigir um longa-metragem no país com Amor Maldito, obra que enfrentou censura e preconceitos ao abordar o relacionamento entre duas mulheres durante a ditadura militar.
Nascida em Belo Horizonte e afastada da mãe ainda na infância, viveu em um abrigo até ser resgatada pela irmã Eliana, responsável também por apresentá-la ao cinema. A primeira sessão, assistindo a Ivan, o Terrível, definiu o rumo de sua vida.
Na adolescência, já no Rio de Janeiro, Sampaio entrou no setor como recepcionista em uma distribuidora ligada ao Cinema Novo. Aprendeu na prática, carregando negativos e improvisando soluções técnicas em meio à precariedade. Aos 22 anos, dirigiu o curta Denúncia Vazia (1979), inspirado no caso real de um casal de idosos despejado após a aplicação da lei da denúncia vazia.
No início dos anos 1980, decidiu filmar Amor Maldito, baseado em um caso que ganhou repercussão policial e expôs preconceitos de gênero e sexualidade. Sem apoio estatal, contou com a colaboração voluntária de atores e técnicos, e aceitou que o longa fosse classificado como pornochanchada para garantir sua distribuição.
Seu trabalho, frequentemente baseado em fatos reais, consolidou uma filmografia que desafia estigmas e afirma autoria. Somente anos depois soube, por pesquisas da historiadora Edileuza Penha de Souza, que era a primeira cineasta negra do Brasil. A descoberta impulsionou a criação da Mostra de Cinema Negro Adelia Sampaio, hoje em sua sétima edição.
Referência para mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+, Adelia segue reconhecida por transformar experiências pessoais e contextos adversos em potência criativa. Sua obra permanece presente em festivais, escolas e formações culturais no país e no exterior.
Apesar das dificuldades, ela resume sua relação com o cinema com a mesma determinação da juventude: “Saí daquela sessão e disse que faria aquilo. E fiz”.






















