Os procuradores do Ministério Público Federal (MPF), Pedro Melo Pouchain Ribeiro e Marianne Cury Paiva, recomendaram que a Secretária de Defesa Agrícola do Ministério da Agricultura e Pecuária (SDA/Mapa) reveja os procedimentos para eventuais alterações no calendário do plantio da soja em Mato Grosso. A Recomendação foi divulgada nesta segunda-feira (22.04), pelo MPF.
A Recomendação do MPF foi feita após a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) enviar ofício ao órgão, questionando a decisão do Mapa.
Segundo o documento do MPF, o Mapa concordou em acatar as recomendações para evitar decisões como a da antecipação do plantio, como ocorreu em agosto de 2023.
Na época, o Ministério da Agricultura atendeu ao pedido da Associação Mato-grossense dos Produtores de Algodão (Ampa), permitindo o plantio da soja a partir de 1º de setembro, invadindo o vazio sanitário, que tem vigência entre 15 de junho a 15 de setembro.
Nesse período, os produtores são impedidos de manter qualquer planta viva de soja na lavoura. Conforme ressaltado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), a pedido do MPF, o vazio sanitário é a principal medida fitossanitária para conter a ferrugem asiática, principal praga da cultura da soja no país.
De acordo com a Recomendação, o Instituto de Defesa Agropecuária de Mato Grosso (Indea) mostrou-se contrário ao deferimento do cultivo excepcional de soja no estado do Mato Grosso, pela ausência de apresentação de embasamento técnico por parte do Mapa para a autorização do pedido formulado pela Ampa, solicitando, inclusive, ao Ministério, justificativas técnicas que embasaram a autorização em caráter excepcional no Estado de Mato Grosso para tal finalidade, e qual seria o plano de prevenção e controle a ser adotado nos cultivos autorizados em caráter excepcional.
Também consta na Recomendação que os pesquisadores integrantes da Embrapa, Mauricio Conrado Meyer, Claudia Vieira Godoy e Rafael Major Pitta, alertaram que os problemas da antecipação do plantio seriam: a necessidade de utilização de uma quantidade superior de fungicidas para a contenção da ferrugem asiática e; a resistência da praga aos produtos utilizados, em razão do alargamento da janela de plantio.
Nas palavras do procurador do MPF, Pedro Melo Pouchain Ribeiro, “a concordância da SDA/Mapa, além de ferir a própria base normativa que a fundamenta, ocasionaria uma série de danos ambientais ao estado de Mato Grosso, notadamente em virtude da ferrugem asiática, citando, ainda, que a decisão desta Secretaria foi extremamente temerária e: banalisou a condição de excepcionalidade estabelecida no art. 10, da Portaria SDA nº865, para o cultivo de soja independentemente do vazio sanitário e do calendário de semeadura; não apresentou um embasamento técnico-científico idôneo que demonstrasse a viabilidade do cultivo de soja ainda dentro do vazio sanitário sem maiores prejuízos/riscos aos produtores e, principalmente, ao meio ambiente; desconsiderou todos os riscos/prejuízos elencados pela Embrapa, a mais importante empresa de pesquisa do Brasil, ligada ao próprio Mapa; desconsiderou todas as insurgências do Indea e da Aprosoja-MT quanto ao pedido formulado pela Ampa.
Um importante ponto, também destacado pelo procurador do MPF, foi o fato de que os prejuízos não se restringiriam apenas às áreas pertencentes aos produtores que optaram por realizar o plantio excepcional, sobretudo em razão da facilidade da proliferação da praga pelo ar, mas também às áreas onde os produtores seguiram o calendário normal de semeadura, pois estes estariam também sujeitos a maiores danos ambientais.
Para o presidente da Aprosoja-MT, Lucas Costa Beber, “a decisão da SDA/Mapa não foi apenas temerária, mas também, incoerente e irresponsável, haja vista que contrariou as próprias normas internas do Ministério e as orientações técnicas da Embrapa, e também, colocou em risco a cultura da soja em Mato Grosso e o meio ambiente, além de prejudicar os produtores que plantaram a partir de 16 de setembro do ano passado, os quais absorveram a proliferação de fungos da ferrugem asiática daqueles plantios que foram realizados durante o período proibitivo do vazio sanitário”.
Por fim, a Recomendação do MPF determinou à SDA/Mapa: promova a complementação da Portaria a SDA nº865/MAPA, especificando, claramente, quais são as condições de excepcionalidade que autorizam a relativização do vazio sanitário e do calendário de plantio da soja; que não autorize a relativização do período do vazio sanitário e do calendário da soja, constantes no Programa Nacional de Controle da Ferrugem Asiática da Soja, sem a demonstração da “condição de excepcionalidade”, prevista no art. 10, da Portaria SDA nº865 (ou em posterior regulamentação), subentendida como uma situação fora do comum, devidamente justificada, de modo que o solicitante ou a SDA, esta quando da análise do pedido, demonstre, por meio de elementos técnicos (estudos, pesquisas, pareceres, dados empíricos e outros, elaborados por instituições públicas e/ou privadas de notório reconhecimento) que os riscos ambientais do cultivo excepcional são os mínimos possíveis, e que o respectivo cultivo não comprometa a eficácia das medidas já existentes para o combate/contenção da ferrugem asiática; que não autorize qualquer tipo de alteração do calendário do plantio de soja no estado de Mato Grosso (início e término) sem embasamento técnico (estudos, pesquisas, pareceres, dados empíricos, e outros, elaborados por instituições públicas e/ou privadas de notório reconhecimento) que demonstre a ausência de prejuízos ambientais dessa medida.
O MPF determinou o arquivamento do inquérito para analisar o caso, já que a SDA/Mapa demonstrou boa-fé, reconhecendo a necessidade de alteração da portaria. Por outro lado, o MPF disse ser necessário a instauração de um Processo Administrativo para acompanhamento da “efetiva complementação/alteração da Portaria nº SDA/Mapa”.