Nancy, a cidade francesa da Art Nouveau

Capital da Lorena, município no interior da França possui um museu a céu aberto de edifícios construídos pelo movimento artístico

Fonte: REDAÇÃO CENÁRIOMT

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Até o século 18, Nancy — cidade a 385 km de Paris, na região de Grand Est — era composta por duas cidades fortificadas diferentes: ao Norte ficava Ville-Vieille, um povoado medieval, enquanto ao Sul estava Ville-Neuve, fundada apenas no final do século 16. Hoje, quando se compra passagens aéreas para a bela capital da Lorena, o que se descobre é um único e ainda desconhecido destino para os turistas brasileiros.

Em 1750, Stanislau I (Stanislau Leszczyński), rei da Polônia e sogro de Luís XV, (monarca da França entre 1715 e 1774), destruiu as muralhas que separavam as duas cidades e ordenou o arquiteto francês Emmanuel Héré de Corny de projetar um novo e único centro urbano. Assim, surgiu a atual Nancy, hoje famoso destino turístico francês pela arquitetura, pela história e por ter sido o berço do movimento artístico art nouveau.

Os edifícios erguidos por Héré por ordens de Stanislau I constituem um dos mais perfeitos e homogêneos exemplos existentes da arquitetura francesa do século 18. A praça pública retangular chamada Place Stanislas — cartão-postal de Nancy — possui quatro grandes esquinas ornamentadas com grades de ferro forjado e bordas douradas. Em um dos lados da praça está o Hôtel de Ville (a prefeitura) e, de outro, está o Musée des Beaux-Arts, que possui uma enorme coleção de pinturas barrocas e rococós.

Em frente à prefeitura está um arco monumental, construído em nome de Luís XV e que dá passagem à Place de la Carrière. O Palais du Gouvernement, construído no século 18, fica no final da praça, com suas arcadas icônicas gregas, cujo prédio adjacente é o antigo Palais Ducal, que hoje abriga o Musée Historique Lorrain, com uma vasta coleção de arte e folclore regionais.

História

No século 11, Nancy era uma cidade pequena dominada por um único castelo. Fortificada um século depois, se tornou logo a capital dos duques da Lorena. Em 1477, Carlos, o Temerário, duque da Borgonha, foi morto enquanto tentava tomá-la. No século 16, quando se tornava uma cidade próspera, outro duque, Carlos II, de Lorena, fundou Ville-Neuve, que logo foi capturada pela França novamente em 1633 e devolvida aos duques depois do Tratado de Rijswijk, em 1697.

Luís XV entregou Nany e o duque de Lorena a Stanislau I depois que ele perdeu a coroa polonesa, em 1735 — a cidade só foi passada novamente à França depois que o rei morreu. Depois da Guerra Franco-Germânica, entre 1870 e 1871, a população começou a crescer significativamente, à medida que o local se tornou o principal refúgio de migrantes franco-parlantes vindos das regiões da Alsácia e de Metz, que tinham se tornado territórios alemães. Nancy também foi bombardeada durante a Primeira Guerra Mundial, mas mesmo próxima da fronteira com a Alemanha, passou quase despercebida durante o segundo conflito (1938-1945).

Hoje, Nancy rivaliza com Metz como uma capital administrativa e de negócios da Lorena. Famosa por sua cultura e suas artes, possui um grande centro de ensino superior com três universidades que atrai alunos franceses de todo o país. É um dos pontos centrais da metalurgia, das indústrias elétricas e da química da França, assim como conhecida pelas suas inovações na área de biotecnologia.

Atrações

A Place Stanislas é a cara de Nancy em todos os roteiros turísticos, muito por sua semelhança com a Place de la Concorde, em Paris, e a Place de la Bourse, em Bordeaux, na Riviera Francesa. Os portões de ferro com ornamentos dourados foram projetados por Héré, mas são trabalho de Jean Lamour, e alguns deles cercam fontes desenhadas por Barthélemy Guibal.

O arco triunfal que oferece saída da Place Stanislas se abre para a Place Carrière, outro lugar público que aparece nos roteiros de Nancy: uma praça discreta diante da fama da Stanislas, a Carrière foi parte do projeto ordenado pelo rei polonês a Héré e, assim, é outro exemplo da arquitetura praticada na França no século 18. Seguindo por ela se chega a outra praça, a Place d’Alliance — as três formam o conjunto arquitetônico de Stanislau. Pequena e íntima, parece completar as duas irmãs maiores: juntas, elas receberam o título de Patrimônio Histórico Mundial da Unesco, braço da ONU para a cultura, em 1983.

Na parte velha de Nancy, a maioria das construções data do século 16, cuja maior parte permanece até hoje. O melhor exemplo da arquitetura da época é o Craffe Gate, construído na metade do século 14 e que hoje é o edifício mais antigo do município — durante o século 15, abrigou até uma prisão. As duas torres gêmeas do prédio foram construídas em 1463 e têm paredes de três metros de espessura, cujas janelas eram abertas para permitir que o exército local atirasse em todas as direções contra os invasores.

É daquela época também a maioria dos pontos centrais, como a Porte Saint-Nicolas, a Porte de la Citadelle e a Porte Saint-Georges. Muitos arcos também foram erguidos no século 18 como monumentos de Nancy: o Arco do Triunfo Héré, entre as praças Stanislas e Carrière, a Porte Saint-Catherine e sua contra-parte, Porte Stanislas, e a Porte Désilles.

No entanto, o que atrai muitos turistas para a cidade da Lorena francesa é a arte, ou mais especificamente o movimento art nouveau e seu envolvimento com a arquitetura. Conhecido como o primeiro estilo moderno a florescer no século 20, ele chegou às construções quando ainda se debatia se o movimento era um estilo ou um detalhe artístico. Nancy, no entanto, foi a resposta: foi na École de Nancy que nomes como Louis Majorelle, Jacques Gruber, Émile Gallé, Jacques Gruber, Victor Prouvé, Eugène Vallin e Alexandre Bigot adquiriram reputação internacional pelas suas ideias — e foi na cidade onde eles colocaram-nas em prática.

Contrária à precisão geométrica do neoclassicismo, a art nouveau tirou inspiração do mundo natural na tentativa de criar algo novo. Ela abrange todas as formas de arte e design, incluindo pintura, materiais em vidro, móveis, design gráfico e arquitetura. Foi em Paris, apesar de Nancy ser o berço do movimento, que a art nouveau fez sua primeira aparição, arrancando aplausos e críticas aos artistas da École de Nancy.

Eles criaram lojas, bancos, prédios e casas usando a união entre a arquitetura e o estilo decorativo inspirado pela vida natural e pela ciência. Sua impressionante mistura de estilos arquitetônicos criou uma atmosfera que hoje transformou a cidade em um oásis para arquitetos, historiadores e artistas, já que a arquitetura art nouveau teve um impacto significativo na vida de Nancy — aos menos 250 construções são registradas na cidade como criadas a partir das ideias do movimento, tanto no centro como no subúrbio.

Exemplos deles são o prédio do jornal L’Est Républicain, erguido em 1912 por Pierre Le Bourgeois, a Brasserie Excelsior, um emblemático restaurante construído em 1910 pelos arquitetos Lucien Weissenburger e Alexandre Mienville para receber os recém-chegados à Nancy pela estação ferroviária, e a sede da extinta loja de departamentos Les Magasins Réunis, também de Le Bourgeois, que chama atenção do centro da cidade. O site French Moments elaborou recentemente uma lista com outros 27 edifícios art nouveau de Nancy.

Durante todo o século 20, não houve nenhum outro movimento arquitetônico europeu tão significativo e popular quanto a art nouveau: em um curto período, ela se espalhou por muitas capitais do continente, como Paris, Barcelona, Viena, Munique, Glasgow e Turim. Nancy, porém, permaneceu como o museu a céu aberto por excelência das obras dos artistas fundadores do estilo — e a importância disso é tão grande para a cidade que recentemente o guia Michelin criou um tour art nouveau apenas para levar turistas pelos exemplares mais acabados do movimento.

Para a historiadora e jornalista brasileira Renata Inforzato, Nancy apenas aparenta ser pequena, mas pode levar uns dias de um turista mais atento. “Apesar de não ser uma cidade grande para os nossos padrões, em Nancy há muita coisa para se ver. O negócio é se adaptar ou fazer uma triagem nas atrações, de acordo com o tempo de viagem de cada um”, conta.

Inforzato possui um site chamado Direto de Paris onde relata passeios que faz pela capital francesa, pela França e pela Europa. Segundo ela, outras atrações obrigatórias para qualquer turista em Nancy são as igrejas (“É assim em toda a França”, diz ela). Para ela, a principal delas é a catedral da cidade, construída no início do século 18 pelos arquitetos Jules Hardouin-Mansart e Germain Boffrand com portões produzidos pelo mesmo Jean Lamour, além de um grande órgão e uma cópula pintada por Jacquard.

Historicamente, a presença da catedral em Nancy é devida às ambições pessoais dos duques de Lorena. Quando os três bispados de Toul, Metz e Verdun, na mesma região, foram incorporados ao reino da França, no século 16, o território do ducado não tinha uma cidade com algum tipo de importância religiosa. O bispado mais próximo de Nancy, Toul, era influenciado por outros duques.

Carlos III, então, sonhou em reforçar a importância dos seus estados obtendo a diocese de Nancy do papa, podendo competir com os três bispados da Lorena. Suas tentativas, no entanto, foram fracassadas: ele conseguiu apenas obter um título primário, que foi dedicado à Nossa Senhora da Anunciação. Planejada já durante a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), os trabalhos em sua construção só foram iniciados com vigor em 1742, perto dos anos da Revolução, quando ela seria pilhada e transformada em um templo para o “culto da razão”.

A cúpula da Notre Dame de Nancy representa a Glória Celestial, e cerca de 150 personagens, entre santos, profetas e anjos estão pintados nela. A igreja também abriga quadros de Jean Girardet, como Sacré-Coeur (na capela de mesmo nome) e uma Assunção (Assomption). Jacquard, aliás, foi o pintor mais importante de Nancy durante o reinado de Stanislas (o último duque de Lorena), no século XVIII. Em 1777, logo após a anexação do ducado pela França, a igreja se tornou catedral.

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