Nos crimes de violência doméstica contra a mulher, a palavra da vítima assume especial importância e não há necessidade de representação dela para a persecução penal. É o que reforçou a decisão unânime da Terceira Câmara Criminal, que ainda apontou o fato de ser a palavra da vítima, em vários casos, a única prova para demonstrar a responsabilidade do acusado. Isso porque o agressor costuma atuar sem testemunhas e sem deixar vestígios.
O caso trata-se de um homem que foi condenado pelo Juízo da Vara única da Comarca de Jauru, interior de Mato Grosso, à pena privativa de liberdade total de 6 meses de detenção e um mês de prisão simples. Por meio de recurso, ele buscava a nulidade da sentença por ausência de representação da vítima.
A denúncia que levou à condenação é de dezembro de 2018, quando o homem agrediu a companheira e os enteados, uma menina de 8 anos e um menino de 4 anos. De acordo com as informações do processo, o homem estava insatisfeito com o comportamento do menino e o agrediu com dois tapas. Ao deixar o menino, ele partiu para a enteada, puxando seu cabelo.
Nesse momento, a mãe interveio para defender os filhos e também foi agredida pelo acusado, com mordidas e socos, além de ser atingida por uma cadeira.
Ao ver o padrasto agredir sua mãe, a menina apanhou um prato de vidro e arremessou contra a cabeça do acusado, que revidou desferindo socos contra seu rosto. A Polícia Militar então foi acionada e prenderam o réu em flagrante delito. A mulher informou na delegacia que esta não teria sido a primeira agressão do companheiro a ela e seus filhos.
“O caso dos autos é um nítido exemplo do ciclo de violência sofrido por mulheres inseridas nesse contexto, pois retrata a situação em que a vítima permaneceu no relacionamento agarrada à promessa de mudança do companheiro, mas se viu mais uma vez submetida à violência contra si e sua família, em especial aos seus filhos”, destacou o relator, desembargador Gilberto Giraldelli.
O magistrado defendeu em voto que as alegações do autor pedindo a nulidade da sentença não deveriam prosperar. Ele cita decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) na qual define que em casos em que envolvem violência doméstica e familiar contra a mulher, “seja caso de lesão corporal leve, seja de vias de fato, se praticado em contexto de violência doméstica ou familiar, não há falar em necessidade de representação da vítima para a persecução penal”.
Portanto, é a palavra da vítima que assume especial importância. O desembargador ainda descreve que não há que se falar em dúvida sobre a existência do crime, diante da comprovação firme e segura da materialidade e da autoria delitiva.
“Se o relato dos fatos pela ofendida é seguro, harmônico e coerente, além de não desabonado ou contraposto por qualquer outro elemento probatório, deve, sem dúvida, prevalecer, sendo apto a demonstrar a materialidade e a autoria das infrações penais imputadas ao increpado”, aponta.
Além do relator, votaram pelo desprovimento dos embargos os desembargadores Juvenal Pereira da Silva, Rondon Bassil Dower Filho.