Quanto pesa uma palavra não dita? Um sentimento não expressado? No filme “A Baleia”, a obesidade e a “gordofobia” são apenas as primeiras camadas da arqueologia de uma alma em sofrimento. Que usa o corpo para carregar suas dores.
Quando atravessamos essa primeira barreira do peso, verificamos que sob o peso do corpo escondem-se outros sentimentos, que segundo a neuropsicóloga Roselene Espírito Santo Wagner são a perda, luto, repressão, castração, culpa, arrependimento, remorso e redenção. “Tal qual o famoso quadro de Edvard Munch: O grito”, relembrou.
Segundo ela, no filme premiado no Oscar e no quadro citado só observamos o pânico, o desespero. Mas no fundo da tela, talvez com olhos atentos, possamos enxergar um pôr do sol. Uma nova possibilidade, no novo amanhecer. A busca do perdão, da redenção e da reconciliação com amores importantes, laços indissolúveis.
“Segundo Freud , ‘É preciso amar para não adoecer’. Mas é igualmente necessário se sentir aceito, antes de ser amado. Pelo que se é, dedicando-se nessa aceitação, no projeto de vir a ser um ser humano. Somente o amor, ofertado e recebido pode nos humanizar de fato”, mencionou.
Ainda conforme Leninha, como é mais conhecida, a Psicanálise aponta que a compulsão por comer constitui apenas uma forma de evitar a angústia que paradoxalmente produz um sofrimento ou um ato que se funde ao eu e cobra seu preço na moeda da angústia. “O personagem central da trama utiliza a obesidade numa tentativa de manifestação por meio do comer excessivo, uma compulsão, que mascara a falta de amor e amar. A intensidade da relação com a comida não parte de uma necessidade nutricional, nem de uma tentativa de obter prazer. Mas sim de uma necessidade de sobrevivência psíquica”, explicou.
“O transtorno alimentar, seja anorexia, bulimia ou obesidade, é apenas o lugar de expressão da dificuldade de lidar com o sofrimento. E o alimento é tido como uma forma de preencher um vazio interno. Tais manifestações ocorrem quando o indivíduo não consegue expressar verbalmente seus conflitos. O psiquismo pode utilizar-se de outras formas para expor o que o aflige. O vazio existencial é sempre marcado pela falta do objeto perdido. Não conseguindo identificar que estamos sempre na esfera do olhar do outro. É pelos olhos que adentramos a alma”, adendou.
Também conforme a neuro, o corpo físico é usado para as representações do ego subjetivo. Não somos só a pele que habitamos, somos principalmente os desejos que guardamos. O desejo de pertença e importância. O desejo de amar e ser amado.
“O personagem come sua fome de todos os amores perdidos, de todos os lutos vividos. É preciso ser humano para entender outro ser humano e igualmente imperfeito e finito, como nós”, finalizou.